VINGANÇA DE LAMPIÃO TODO MUNDO DANÇA NU Francisco Luiz Mendes
VINGANÇA DE LAMPIÃO
TODO MUNDO DANÇA NU
Francisco Luiz Mendes
Meu caro amigo leitor
Peço a sua atenção
No caso que vou contar
Que se deu lá no sertão
Do Nordeste brasileiro
Nos tempos de Lampião.
Numa certa região
Nesse sertão nordestino
Em território baiano
Transitava Virgolino
Vila Nova da Rainha
Para lá foi seu destino.
Com o seu bando ladino
Toando mulher rendeira
Lampião seguia afora
Com a sua cabroeira
Rumo a Pindobaçu
Pra festa casamenteira.
Seguindo na dianteira
Ali gritou Lampião
E vamos lá pessoal
Botar o pé no estradão
A amanhã tem casório
Para nossa diversão.
Com tal legitimação
A cabroeira gargalhou
Na face de cada um
A alegria se estampou
Ao comuna desejado
Ligeiro o bando chegou.
Ocasião foi de gabo
Na vinda de Lampião
Acolá em Pindobaçu
Total a admiração
Todo mundo queria ver
O imperador do sertão.
Por toda a população
Ele foi bem recebido
Sertanejos davam vivas
Grande era o alarido
Lá naquele município
O maior acontecido.
Diante o sucedido
Lampião se resguardou
Reunindo os seus cabras
Ligeiro lhes ordenou
Para ficarem atentos
O assédio lhe assustou.
Sentinela reforçou
Enquanto foi visitar
Amigos lá na fazenda
Onde ia se realizar
O casório anunciado
Que se ouviu tanto falar.
Depois de tagarelar
Com todo povo presente
Lampião se despediu
E afirmou seguramente
Presença no casamento
Com toda a sua gente.
O noivo ficou contente
Ao saber da decisão
Disse: eu e minha noiva
Fazemos muita questão
Ter o Lampião conosco
Pra assistir nossa união.
No entardecer Lampião
Reuniu seu pessoal
Para ir ao casamento
Mais falado do arraial
Da filha do Coronel
José Maria Cabral.
Aliás, o Lampião
Pouco antes de sair
Fez a recomendação
Para todo mundo ouvir
Disse: vamos ao casório
Apenas se divertir.
Ninguém vai se enxerir
Nem sequer desrespeitar
Qualquer família presente
Que por lá se apresentar
Porém nós vamos em paz
Pois em paz quero voltar.
Antes da fala findar
Lampião é interrompido
Por um informante seu
Que já vinha esbaforido
Para lhe dar um recado
Sobre o que se tinha ouvido.
Capitão ouça meu alerta
Dizendo-lhe esse coiteiro
Não vá pra esse casamento
Da filha do fazendeiro
Do Coronel Zé Maria
Pois me escute primeiro.
Por isso aqui vim ligeiro
Só para lhe prevenir
O que ouvi lá na fazenda
Não podia me omitir
O moço que vai casar
Do mundo quer lhe banir.
O noivo mandou reunir
Meia-dúzia de vaqueiro
E no momento oportuno
Você será o primeiro
A receber um balaço
E daquele bem certeiro.
Ele achou um despautério
Presença do capitão
Dia do seu casamento
E um insulto à região
Pois se depender do noivo
Estás fora do festão.
Após essa informação
O Lampião se pausou
Enquanto dava uma pitada
Pro coiteiro interrogou
Onde estarão os cabras
Que o noivo contratou?
Respondeu-lhe esse coiteiro
Ligeiro e sem gaguejado
Os cabras estão agora
No salão dissimulado
Entre parentes e amigos
E também de convidado.
Já está tudo acertado
Dar cabo do capitão
O senhoril fique atento
A qualquer agitação
Bote o dedo no gatilho
E dispare o mosquetão.
E disse assim Lampião
Pessoal vamos marchar
Quero ver nesse pagode
A poeira levantar
Aliás, nesse casório
Hoje a cobra vai fumar.
Festa tava de abafar
Muita comida e sortido
Quando Lampião chegou
Depressa foi recebido
Pelo senhor Zé Maria
Ainda do noivo assistido.
Lampião nem deu ouvido
Àquela recepção
Logo após os cumprimentos
Adentrou para o salão
E mais quatro cangaceiros
À sua disposição.
Nessa mesma ocasião
Outros tantos cangaceiros
Ficaram nos arredores
De olhos nos forasteiros
E em pontos diferentes
Resguardando os companheiros.
Quaisquer gestos dos festeiros
Lampião observava
E como quem não quer nada
Que por ali circundava
Cabra mal-intencionado
Ligeiro nele encostava.
Sabendo o que se tratava
Um suspeito o abordou
Cangaceiro Bem-te-vi
Ao seu lado se plantou
E Canjica mais depressa
Também dele se achegou.
Um dos vaqueiros notou
O olhar de Lampião
Encarando os convidados
Com a cara de leão
Pensou aqui eu não fico
Já prevendo confusão.
Após a sua estratégia
Lampião se exaltou
Naquele momento ali
Punhal desembainhou
Bem no coração do noivo
Rápido ele o encostou.
Além disso lhe insultou
Para todo mundo ouvir
Dizendo pensou você
Que podia me destruir?
Assim sem mais e nem menos
E mandando-me abolir?
Porém estou aqui e agora?
Defronte pra vosmecê
Deste modo lhe pergunto
E tu vais fazer o quê?
Pois duma coisa estou certo
Quem vai morrer é você.
Pois, então, você pensou
Que dava certo seu trato?
Meu caro, a sua armadilha
Ela não pega nem rato
Agora vou lhe mostrar
Como faço com ingrato.
Oh, meu caro camarada!
Porém você se enganou
Calmamente Lampião
A falar continuou
Diante os convidados
Ele ainda debochou.
O noivo se retratou
Perante pai, mãe e irmão.
Tentou se justificar
Pedindo pra Lampião
Que poupasse sua vida
E tivesse compaixão.
Já com a cara no chão
Também muito envergonhado
Diante ali dos presentes
Confessou ter contratado
Meia-dúzia de vaqueiro
Pra matá-lo no bailado.
Com o noivo dominado
E seus capangas também
Lampião disse: – daqui
Não vai sair mais ninguém
Festa vai continuar
Seja por mal ou por bem.
E para mim não convém
Esta festa interromper
Agora vai ficar bom
Assim sendo eu quero ver
Todo mundo dançar nu
Até o dia amanhecer.
Começando desde já
Pelos ilustres padrinhos
Os pais de ambas as partes
Convidados e sobrinhos
Os noivos principalmente
Bailando bem-casadinhos.
Também minha paciência
Já está se esgotando
Quem não quiser ser sangrado
Melhor ir logo dançando
Eu vou ficar no meu canto
De longe só observando.
Pois eu quero ver daqui
Quem está com nem-nhem-nhem
Vou logo advertindo
Não quero matar ninguém
Porém não me queiram mal
Que eu só sei é querer bem.
Gargalharam com desdém
O bando de cangaceiros
Quando ouviram tal ordem
A respeito dos festeiros
E para bailarem nus
Juntos aos casamenteiros.
As filhas dos fazendeiros
Lá daquela região
Continuavam presentes
No meio do pagodão
Elas foram as primeiras
A arrastar pés no salão.
Essa ordem de Lampião
Quem ia desobedecer?
E quem não fosse dançar
Com certeza ia morrer
Pois compreenderam por bem
Sua vontade fazer.
Nunca que vou me esquecer
Desse vexame danado
Assim retrucou a noiva
No ouvido do seu amado
Aliás, ele também
Tava muito encabulado.
Deixe a vergonha de lado
Trate as vestis tirar
Cai ligeiro no pagode
Chega de choramingar
Disse: - Lampião pra noiva
É melhor você dançar.
Ai de quem desrespeitar
O seu par neste bailado
Ali gritou Lampião
Com tom de voz alterado
Quem infringir minha lei
Considere-se castrado.
Neste cordel sextilhado
Descrevi o que passou
Conforme o livro que li
Tal autor assegurou
Garante que Lampião
Muito cabra ele capou.
Fim.