Os quatro mestres “Zé” da cultura popular em Itabaiana

Combinei com Nego Zé

E o seleiro Zé de Nana

Chamei tio Zé do Pão

E o parça Zé Santana

Pra falar dos mestres “Zé”

Provindos de Itabaiana

E dessa fauna urbana

Já fez parte Zé Buraco

O Zé Maria Trigueiro

Zé Granfino e Zé Macaco

Zé Maria do Cartório

E Zezinho do Cavaco

Zé Bodega aqui destaco

E também Zé Calendário

Para póstuma homenagem

Cito seu Zé Olegário

Na cantiga do mourão

Nunca teve adversário

No folheto relicário

Da cultura popular

Mestres “Zé” de Itabaiana

Nós queremos destacar

Famosos e zé-ninguém

Suas vidas vou cantar

Destaco, pra começar,

Um homenzinho franzino

Zé Especiá do Boi

Com a alma de menino

Mestre do boi e reisado

Exímio chefe bovino

Esse boi é natalino

Mas anima o carnaval

Zé Especiá do Boi

Foi artista maioral

Regendo a festa com classe

Era a figura central

Com apito e gestual

Comandava seu folguedo

Com flores e espelhinhos

Adornava seu brinquedo

O seu chapéu de cetim

Guardava muito segredo

O grande anel no seu dedo

Os babados, blusa e capa

A coroa na cabeça

Nada na cena escapa

É cultura enraizada

Que não se encontra no mapa

Zé Especiá é Papa

Da grande religião

Espetáculo do povo

Dança e canto em louvação

Às tradições populares

Folclore da região

Zé Especiá, então,

Relembro e imortalizo

Seu humilde Boi Sansão

Na memória eu reviso

Ecoando seu tambor

Sua maraca e seu guizo

O folheteiro, com siso

Recorda outro artista

Da cultura popular

Fora do elenco elitista

É o Zé Quarenta e Um

Que está na minha lista

Esse Zé era solista

De dança tradicional

Do Nordeste brasileiro

Forte e intenso coral

Chamado coco de roda

Feito uma dança tribal

“Quarenta e um” no vocal

Improvisava uma loa

Com seu bigode vultoso

Era o capitão de proa

Daquela nau exultante

Que nos quilombos ecoa

O coco ainda ressoa

Mistura de índio e preto

“Quarenta e um”, zé cafuzo

Carregava um amuleto

Para afastar a mandinga

E se integrar no seu gueto

Uma indiscrição cometo

Sobre Zé Quarenta e Um:

Foi o maior mentiroso

Igual a ele nenhum

Com sua imaginação

Fugiu do lugar comum

Era caçador de anum

De preá e de rolinha

Mas foi no toque do coco

Que soltou sua andorinha

De artista e de poeta

Naquela cidadezinha

Este relato encaminha

Outro nome encantado

É Zé Mocó dos Caboclos

Um negro velho animado

Fantasiado de índio

Foi um cacique aclamado

Seu caboclinho afamado

Fazendo evolução

Nas ruas de Itabaiana

Nos carnavais de então

É cena imorredoura

Para a minha geração

Essa manifestação

Teve em Mocó uma lenda

O som da seta e do arco

Ritmando a contenda

Dos antepassados índios

Uma original legenda

Numa teatral contenda

A preaca ritmava

O flautim chamado inúbia

A melodia marcava

Caracaxá e tarol

De modulação bordava

E a tribo então flechava

Essa tradição nativa

No coração do folclore

Para manter ela viva

Contando com Zé Mocó

E sua força afetiva

Essa dança descritiva

Na língua do popular

Chamada “cabocolinho”

Zé Mocó a comandar

Marcou uma geração

No carnaval do lugar

Outro grande mestre Zé

Agora eu me dispus

A comentar no folheto

Já que a isso me propus

Sobre o poeta matuto

Chamado de Zé da Luz

Sua figura entreluz

No agreste paraibano

Cantando o Brasil real

Enquanto cortava pano

Pois que era alfaiate

E cronista do mundano

Mas Zé da Luz tinha um plano

Foi ao Rio de Janeiro

Trabalhar em uma casa

De alfaiate e sapateiro

Vizinho à livraria

José Olympio livreiro

Então se tornou parceiro

De ilustres escritores

Que liam seus versos simples

Retratos de suas dores

De seu amor pela terra

Em criações multicores

Foi através dos favores

Dos tais da literatura

Que Zé da Luz publicou

Uma pequena brochura

Chamada “Brasil caboclo”

De nordestina textura

Contando a desventura

O espírito, a magia

Do sofrido nordestino

Transformado em poesia

“No romper das alvorada”

Verso tosco que doía

Dele José Lins diria

Que o rico imaginário

Do Nordeste brasileiro

Como se fosse um sumário

Cabe no Brasil Caboclo

Em seu lírico glossário

E dentro desse cenário

Zé da Luz foi genial

O povo até hoje canta

Na praça, feira e curral

As rimas, versos e causos

De aparência banal

Mas fonte primordial

Para entender nossa alma

Com o sabor e o cheiro

Que em seu livro se espalma

Telúrico e comovente

Feito com pico de palma

O folhetista se acalma

E termina seu trabalho

Sobre Zés de Itabaiana

Mas é só um cabeçalho

Temos mais cinco mil zés

Em outro cordel detalho.

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 11/02/2021
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