DONA NENÉM

   A sua Arte deu cores

ao Galo de São Gonçalo

 

 

Aos meus queridos leitores

E às leitoras também

Venho, através do cordel,

Apresentar mais alguém

Numa história biográfica

Que à Cultura só faz bem.

 

"Apresentar" entre aspas

Pois o Mundo já conhece

A história da mulher

Que agora em cordel se tece.

Mais uma mulher de garra

Que de homenagens, carece.

 

A dama de quem eu falo

Trabalhou por toda vida

Em prol do nosso Folclore

Numa labuta renhida.

Porém isto só foi "visto"

Depois da sua partida.

 

Nascida em 15 de abril

Do ano de vinte e sete

Do século vinte, bem jovem,

Sua sobrinha[i] repete,

Afirmando veemente:

Como artesã já se mete.

 

 

Nome: Maria das Neves

Felipe. Mais conhecida

Como Neném que, depois,

A este sendo acrescida:

Dona. E Dona Neném

Ficando o resto da vida.

 

Santo Antônio dos Barreiros

Que hoje é do Potengi,

Onde nasceu e criou-se.

Viveu toda a vida ali.

Ela com mais seis irmãos.

Informações, consegui.

 

O seu pai: Pedro Felipe

Da Cunha que era casado

Com sua mamãe: Joaquina

Alves da Cunha foi dado

Obtido da sobrinha[ii]

Que me informou de bom grado.

 

Aos doze anos apenas

Já começa a trabalhar

Com argila modelando,

Cavalinhos a criar

Tornou-se logo aprendiz

Do mestre ali do lugar.

 

O Mestre Antônio Soares!

Já então bem conhecido

Como um grande ceramista

Tendo o seu trabalho sido

Usado pelos políticos[iii].

Mas hoje quase esquecido.

 

Voltemos à aprendiz,

À Neném adolescente

Que trabalhava a argila

Ainda inocentemente

Com carinho e com prazer.

O seu Mestre isto pressente.

 

Se dedicando com gosto

À aprendiz que denota

Amor pelo seu trabalho

Sem se interessar por cota,

Fazendo-o com alegria

Faz com a direita e a canhota.

 

Primeiro alisando as peças

Que o Mestre lhe oferecia!

Depois, com experiência,

Suas próprias peças cria.

E vai alisando as mesmas

Como aprendeu dia a dia.

 

Dedica-se com afinco

A dar finalização

Na peça. Ao acabamento

Dando maior atenção

À fase de alisamento

Em busca da perfeição.

 

E logo, logo se vê

A diferença existente

Entre o trabalho do Mestre

E o de sua Assistente:

O dele é utilitário

E o dela mostra o que sente.

 

Aqui entra o Galo Branco,

Da forma como surgiu

Das mãos de Antônio Soares,

De como ele o fez e viu.

De uma forma utilitária

O mesmo lhe produziu.

 

Um depósito para água

Ao qual chamamos quartinha,

Onde o gargalo era a cauda!

Nenhuma pintura tinha.

O que Neném pôs no galo?

Você me diz se advinha.

 

Morrendo Antônio Soares

Dona Neném continua

Seu trabalho, mas, agora,

O Galo já tem a sua

Marca onde vê-se alegria

Nas cores que nele atua

 

Continua sendo branco

Mas tem rosas que o enfeitam!

Já não sendo utilitário,

Tem as cores que deleitam

Aos olhos de quem as vê

E, como arte, as aceitam.

 

A arte que representa

O Folclore do RN

E pelo mundo se espalha

De forma bela e solene

Mostrando a sua beleza

Que comprovou ser perene.

 

Voltemos agora um pouco

Pra falar da criatura

Que foi a Dona Neném:

Uma mulher de cultura

Inata porque amava,

Dos saberes, a mistura.

 

Um pouco da sua vida

Particular também vem

Por um pouco de pimenta

Na história e que convém

Mostrar um pouquinho ao público

Que a ama, que lhe quer bem.

 

Dois homens no seu caminho

Passaram, mas não durou.

Em convivências difíceis,

Dois filhinhos, Deus levou.

E assim continuou só

Como o Senhor programou.

 

Uma mulher decidida

Como todos podem ver!

Para o povo do seu tempo,

Além do tempo! Ao fazer

Sua própria caminhada

Sem nada a ninguém dever.

 

Sendo uma mulher de fé,

Da sua família amante,

Morou sempre próximo à mãe

Dando assistência constante

À mesma, e dos seus irmãos

Nunca quis ficar distante.

 

Católica não praticante!

Às orações, dedicada,

Rezava pra quem pedia

Sem pedir, sem cobrar nada,

A não ser que quem pedisse

Cumprisse a promessa dada;

 

Ainda não tendo filhos

Pra ensinar o que aprendeu

Com o seu Mestre admirado

Por si o que recebeu

Do mesmo, distribuiu.

De presente também deu.

 

Hoje Paulo e Miraci[iv],

Sobrinhos do coração

De Dona Neném, prosseguem,

Cumprindo a sua missão

De trabalho pra Cultura

Por amor e obrigação.

 

O Folclore do RN

Merece ser celebrado

Pra nunca ser esquecido

E nem deixado de lado.

Por isso caros leitores

Eu deixo aqui meu recado:

 

Nossas expressões artísticas

Não podem ser esquecidas!

Bem como os nossos artistas

Que levaram suas vidas

A trabalhar pra deixar

Suas obras construídas.

 

O que havia na beleza

De sua alma iluminada

Dona Neném nos deixou

No Galo Branco, gravada,

Com flores e belas cores,

Sua Madrinha tornada.

 

A madrinha que o levou

A se espalhar pelo mundo

Mostrando um pouco do nosso

Folclore belo e fecundo

Onde sua alma de artista

Aflora a cada segundo.

 

Axé pra Dona Neném!

Eu sei que onde ela estiver

Certamente está feliz

Por ter sido uma mulher

Especial neste mundo.

E até quando Deus quiser!

 

 

 

Rosa Regis

Natal/RN – janeiro de 2022

 

 

Nota: Cordel incluso na Coleção

DEZ MULHERES POTIGUARES – 5ª edição.

 


[i] Miraci... sobrinha de Dona Neném que segue

Trabalhando com cerâmica

 

[ii] Miraci... trabalha com artesanato em cerâmica e

reside até hoje em Santo Antônio do Potengi, antigo

Santo Antônio dos Barreiros, município de São Gonçalo

do Amarante.

 

[iii] Djalma Maranhão, que foi um entusiasta militante

da cultura popular, responsável pela promoção de

eventos sobre folclore e cultura nordestinos nos anos

70; Hermilo Borba Filho (1969) que nos anos 60 fez

uma incursão pelo Nordeste brasileiro numa pesquisa

sobre a cerâmica nordestina e que originou o livro

 “Cerâmica Popular do Nordeste”, que é o mais antigo

registro bibliográfico sobre Antônio Soares.

 

[iv] Paulo e Miraci – sobrinhos de Dona Neném