VELÓRIOS...
Pode ser o morto que for
As conversas sempre as mesmas
Durante o dia ou à noite
Vela apagada ou acesa
Os murmurinhos começam
A criatura indefesa
Cafés, chás e biscoitinhos
Servidos ou sobre a mesa
Pra receber os visitantes
Os parentes em tristeza
Frases comuns se repetem
Nos lábios de quem conforta
"Foi a vontade de Deus"
Frase que nada exorta
"Pelo menos não sofreu"
Dito que nada importa
O choro e as lamúrias
No caixão, de porta em porta
Alguns logo se aproximam
Começam a afirmar
"Parece que tá dormindo"
Clichê não pode faltar
"A vida não vale nada"
Alguém diz a ressaltar
"Eu falei com ele ontem"
Outra que é bom listar
E os parentes se comportam
Uns com choros bem contidos
Outros gritam esparrosos
"Não vai, me leva contigo"
"Não sei como vou viver"
Desejo não garantido
Cada um da sua vez
Se ele foi o escolhido
Eu que não peço a Deus
Pro destino ser invertido
"Até parece que ontem
Estava se despedindo"
É a viúva quem diz
Cambaleando, caindo
O esposo sendo enterrado
E o outro já "vem vindo"
A fila anda, meu irmão
Registra e bota carimbo
O povo não perdoa
Não importa a dor que doa
Ele fala e vai saindo
"Te conforma Julieta"
Dizia a mais segura
"Era pessoa tão boa"
Diante da amargura
Escrevendo estas rimas
Lembrei-me de uma figura
No velório do meu pai
Disse com toda brandura
"Não faz fuxico de mim
Pros santos lá nas alturas"
Velórios não são momentos
Pra piadas, pra sorrir
Mas cada coisa se vê
Não tem para onde ir
Coloque as mãos no rosto
Sorrisos a encobrir
À família, todo respeito
Vou te observar com jeito
E volto pra conferir
Cléa Simone Oliveira Soeiro
Instagram: cleasoeirooficial