PROMESSAS DE NATAL

O dia estava lindo, com clima bastante ameno. Reunidas, Rose, 78 anos; Jovina, com 75 e Sebastiana, uma simpática negra, com 82 anos, esta, já esclerosada, mas com um sorriso permanente nos lábios. Todas as tardes elas ficavam na varanda crochetando e relembrando outras fases etárias.

— Nossas vidas dariam um belo romance” — comenta Rose.

— A minha acho que seria uma comédia, diz Jovina. Pela manhã quando vou me lavar e vejo estes vincos e a cara toda amassada, me lembro dos elogios do meu primeiro namorado falando da maciez e perfeição do meu rosto. Tenho vontade de gargalhar.

— E teus filhos Jovina? Como estão? Eles virão aqui na quinta-feira?

— Não! Mandaram me avisar que irão até Porto Seguro. Minha filha e meu genro há muito que querem fazer essa viagem. Coitados. A vida aqui em São Paulo não é fácil. Trânsito difícil, poluição, escolas dos meus netinhos, uma vida agitadíssima. É ótimo que eles saiam para viajar. Eles merecem.

— Foi para Gramados que eles viajaram no ano passado?

— Isto mesmo. Gramados. Você já esteve no Rio Grande do Sul? Quando eu era mais jovem, participei de uma peça de teatro em Porto Alegre.

— Você foi atriz?

— Que atriz que nada, era uma peça do colégio das Irmãs Redentoristas onde estudava. Fomos encenar o nascimento de Cristo, foi bem nesta época de Natal. Era uma peça lindíssima. Comovente. Fomos aplaudidas de pé pelas nossas colegas gauchas, de um colégio de lá. A propósito, um dia você disse que adorava cantar. Ficou de me contar tuas façanhas e nunca deu certo. Fale-nos agora.

Rose, colocando os dedos de sua trêmula mão direita na boca, deu umas rápidas tossidas, pigarreou e com voz firme iniciou a cantar “Carinhoso”. Muito afinada e quase que conseguindo alcançar todas as notas que exigiam mais de um contralto. Ao encerrar, Jovina e Sebastiana não pouparam os aplausos e elogios.

— Nunca fui profissional, mas tive a honra de cantar no Chacrinha numa tarde onde estava um calouro lá. Quem? Quem?— pergunta. — Roberto Carlos. Ele mesmo. Roberto Carlos. Na época era pouco conhecido. Eu sempre adorei cantar. Na fábrica onde eu trabalhava, eu era a que mais cantava enquanto trabalhava.

— E seus filhos, Rose?

— Também foram viajar. Dezembro ele falam que não ficam em São Paulo por dinheiro nenhum. Queriam me levar para o Guarujá, onde foram passar as férias, mas a bendita da sogra do meu genro inventou de ir também, e com a bagagem, não haveria mais lugar para mim. Não tem importância, ano que vem vou com eles. Se eles tivessem aqui certamente viriam me ver.

— Faz tempo que você não vê sua filha?

— Foi no ano que teu pessoal esteve aqui. Há três anos. Mas, coitada de minha pequena. Ela possui a mesma vidinha paulistana que teu filho. Trânsito, trabalho, faculdade dos meninos.

Sebastiana mesmo conseguindo ouvir pouco, enxuga umas teimosas lágrimas e tenta consolar suas velhas amigas.

— Minhas queridas, meus filhos estarão conosco.

— Mas seus filhos não morreram?

— Sim! Se eles estivessem vivos jamais deixariam sua velha mãe num asilo. Mas o Papai Noel que esteve aqui me falou que espiritualmente, eles estarão juntos de todas nós.

Uma sinetinha na sala contígua a varanda anunciava a necessidade das senhoras irem se lavar para poderem participar do jantar que seria servido às 18 horas e 15 minutos.

Também, para elas não importava muito em ter de ir dormir mais cedo, a televisão estava no conserto há duas semanas e elas já nem sabiam mais se a telenovela havia ou não terminada.

sábado, 20 de dezembro de 2008

Luiz Celso de Matos
Enviado por Luiz Celso de Matos em 21/12/2008
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