A EXPERTISE ESTÁ BOMBANDO

Tem gente que acha que a palavra Junior é um termo da língua inglesa; e que significa filho quando colocado no fim do mesmo nome do pai. Não é isso. Significa que uma pessoa é mais jovem em relação à outra e sua origem é latina, do Latim, em oposição à sênior.Assim sendo o plural de júnior é juniores e não “juniors” como se faz o plural em inglês de palavras terminadas em “r”. Essa não é uma palavra nova em nosso idioma, certamente, mas por muitos e muitos anos tem sido usada de forma incorreta a partir dessa crença e por contaminação.

As palavras são criações autênticas dos povos e seus significados são dados de acordo com a função a qual são determinadas em dado momento. Isso mantém uma língua viva; novas palavras são acréscimos revitalizantes. Há regras próprias e especificas, porém, e elas devem ser seguidas, sem dúvida. Além delas também existem as regras de bom gosto,bom senso e as que determinam estilos apropriados a funções, atividades, ocasiões e assim por diante.

Palavras novas são incorporadas aos idiomas quanto mais para elas encontra-se utilidade e não importa que sejam de outras línguas. O que não me parece correto é usar uma palavra estrangeira quando temos a correspondente em nosso próprio idioma. Com a informática, a internet, o uso de computadores pessoais o idioma inglês tem ocupado enorme espaço em nosso cotidiano. Mas não precisamos usar “deletar” que mais parece ter a ver com deleitar do que com “delete” (dilit) quando temos o termo apagar. Ou mais próximo dele, temos “delir”, que apesar de sua feiúra gráfica e sonora, também significa apagar. E “save” tem os mais diversos significados quando verbo, ou preposição ou conjunção. Para o que pretende a informática temos guardar, preservar. A informática, essa ferramenta ou instrumento indispensável em toda e qualquer atividade, deixará marcas para sempre nos mais diversos idiomas em todo o planeta. Marcas que poderão ser tão boas quanto absurdas e desnecessárias como, em nosso caso, além das que já citei, lincar, blogar, clicar, teclar, logar...

Tem gente que acha que está tudo certo e que é assim que deve ser. Ou pior, dizem: “fazer o que?”.Pode ser. Mas é preciso saber um pouco mais. Ter mais conhecimento do próprio idioma antes de subverter palavras alheias. Não é preciso ser um “expert”, essa bela palavra francesa e não inglesa como pode parecer à primeira vista, para escrever e-mails, cartas, blogs e outras comunicações no computador se esse tiver um bom corretor ortográfico. Já é o bastante. Todavia para bem escrever é preciso ter bons conhecimentos das armadilhas da língua e muita leitura. Ler já ajuda e ler muito aprimora. E ler em mais de um idioma enriquece. Quando me refiro ao uso incorreto de palavras estrangeiras em nosso idioma português brasileiro não me recuso a aceitar novas palavras, sejam elas de que idiomas forem, em nosso vocabulário. O que me incomoda é não usar a que já temos e substituindo-a por uma outra, de outro idioma, por modismo ou afetação. E o que mais me incomoda ainda é a junção de palavra de dois idiomas distintos num substantivo próprio. Como exemplo: Condomínio Ville d`Alfa, Salão de Beleza Belle Famme, Torre Empresarial Quixadá, Tabajara Resort and Spa, Macanudo`s Delivery. Simplesmente ridículo. Porém não penso como os modernistas da Semana de 22, nem sofro de cainotofobia. Apenas acho ridículo. E fico pensando o que diria hoje Olavo Bilac ao ver edifícios e empresas assim batizadas. “A pátria não é raça, não é meio, não é o conjunto dos aparelhos econômicos e políticos: é o idioma criado ou herdado pelo povo”, escreveu o poeta.

O que mantém os idiomas bem vivos e bem falados, são, também, as incorporações de palavras estrangeiras e suas modificações, como se sabe, de modo que expressem um significado na ausência da existência de palavra similar, como também pela alteração do modo de escrever e pronunciar. Assim a língua portuguesa falada e escrita quando fomos achados por volta de 1498 e apossados em 1500 pelo maior império do planeta nos séculos XV/XVI, em extensão territorial, de toda a história da humanidade, Portugal, passou por alterações, tanto na escrita quanto na prosódia. Africanos trazidos para cá a força e a ferros e índios daqui mesmo subjugados, todos escravizados, além dos braços contribuíram com danças, músicas, hábitos, usos, costumes e palavras. Daí que anhangabaú, berimbau, para ficar com apenas esses dois exemplos entre milhares de outras palavras, somente se encontram na língua portuguesa falada no Brasil, como também os nomes da maioria dos Estados brasileiros e de milhares de cidades. Todos nomes de origem tupi/guarani.

A Carta que Pero Vaz de Caminha escreveu ao rei D. Manuel, considerada nossa Certidão de Nascimento, não foi a unica que o soberano português recebeu contando o achamento da nova terra. Menos famosa e considerada do que essa é a carta que escreveu o espanhol João Faras; a Carta do Mestre João. Escrita numa incrível mistura de espanhol e de português quinhentista.

“Señor

O bacherel mestre Johan fisico e çirurgyano de Vosa Alteza beso vosas rreales manos. Señor porque de todo lo aca pasado largamente escriuieron a vosa alteza asy arias correa como todos los otros solamente escreuire dos puntos Señor ayer segunda feria que fueron 27 de abril desçendimos em terra yo e el, pyloto do capitan moor e el pyloto de Sancho de touar e tomamos el altura del sol al medio dia e fallamos 56 grrados e la sonbrra era septentrional por lo qual segund las reglas del estrolabio jusgamos ser afastados de la equinocial por 17 grrados, e por consyguiente tener el altura del polo antarctico en 17 grados, segund que es magnifiesto en el espera”

Quase impossível ler e compreender esse trecho da Carta de Mestre João que hoje seria escrita assim, ainda que cheia de incorreções:

“Senhor:

O bacharel mestre João, físico e cirurgião de Vossa Alteza, beijo vossas reais mãos. Senhor: porque, de tudo o cá passado, largamente escreveram a Vossa Alteza, assim Aires Correia como todos os outros, somente escreverei sobre dois pontos. Senhor: ontem, segunda-feira, que foram 27 de abril, descemos em terra, eu e o piloto do capitão-mor e o piloto de Sancho de Tovar; tomamos a altura do sol ao meio-dia e achamos 56 graus, e a sombra era setentrional, pelo que, segundo as regras do astrolábio, julgamos estar afastados da equinocial por 17°, e ter por conseguinte a altura do pólo antártico em 17°, segundo é manifesto na esfera.”

Palavras entram e saem dos idiomas; caem no desuso, perdem seu sentido e seu significado. Outras ganham espaço numa determinada língua, mesmo não sendo novas em seus idiomas de origem, mas apenas porque viram moda. A palavra da moda hoje é expertise. De origem francesa, nova em nossa língua portuguesa, expressa a qualidade de quem é perito num assunto; de um conhecedor, de um especialista em alguma coisa, como explica Aulete, o dicionário. Pois a “expertise” está “bombando”.

CESAR CABRAL
Enviado por CESAR CABRAL em 30/05/2008
Código do texto: T1011903
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