Herói é um covarde que não teve tempo de pensar

Anoitecia e se via o clarão de longe: uma Brasília queimando ao lado da estrada. Calma, apenas um carro; para a outra ainda falta um Nero. Extintor na mão, corri ao local, tropeçando em uma dezena de extintores vazios espalhados pelo chão sem que o fogo desse sinal de se humilhar. Lembrei das poucas instruções que recebi, enfiei o aparelho e parte dos braços nas chamas e, ao primeiro apertão, o fogo apagou. Deduzi que os outros, cautelosamente, não se aproximaram o suficiente e, por isso, não lograram êxito. Depois me dei conta: e se essa nheca explode? Taquicardia instantânea.

Pescando na Barra do Sul, na época em que não havia sequer os molhes, atravessei a barra e segui rumo ao norte, em busca de um largamar onde os robalos se concentrassem. Encontrei-o, mas o robalo mais parecia um filhote de baleia, e se afogava. O homem devia pesar bem mais de 100 quilos e caíra num buraco, a certa distância da praia. A mulher, solícita, correu até o início da arrebentação e arremessou uma bóia a ele. Uns 30 metros dele, para ser mais exato. Joguei-me na água, peguei a bóia e fui ao encontro do infeliz. Ele estava paralisado de medo, afundando. A duras penas, pois nadar nunca foi meu forte, consegui levá-lo até o raso, onde, depois de muita insistência minha, ficou de pé, água pelos joelhos. ainda agarrado à bóia e com o calção caído, mostrando o bundão branco. Um espetáculo! Sentei na areia e pensei: e se ele, ao invés da bóia, resolvesse me agarrar? Ao menos vocês não teriam que me aturar toda sexta-feira.

“Então vem aqui me pagar um b...” foi a gentil resposta do skatista a quem pedi para voltar a andar no dia seguinte, pois já era quase meia noite e ninguém conseguia dormir devido ao barulho (verdade, pedi com toda educação). Liguei para a polícia, vesti a primeira calça que achei, uma blusa de moletom, tudo por cima do pijama. Calcei um chinelo e, assim, como um samurai alemão desengonçado, desci. O moço (uns 20 anos e bem forte), se juntara à turma. Chamei-o para fazer o que ele havia sugerido. Não veio. Fui buscá-lo e o arranquei do meio dos amigos. Após dar-lhe alguns empurrões não tão gentis y otras cositas, sem qualquer reação dele, um dos amigos insinuou que eles poderiam me bater. “Inteligentemente” chamei-os todos para a briga, mas que viesse um por um. Não preciso dizer que nenhum veio, pois, se digito este texto é porque ainda tenho alguns dedos. Certamente acharam que havia um bando de franco atiradores no prédio só esperando um sinal meu para abrir fogo. Depois de meia hora, encontrei a polícia e fomos para a delegacia. Aproveitei para avisar o moço que agora sabia onde era a casa dele. Nem um pio saiu de sua boca. De volta à minha cama, acordado devido à overdose de adrenalina, abri os olhos. E se ele, muitíssimo mais ágil e forte do que eu, reagisse? E se todos resolvessem me bater?

Decididamente, herói coisa alguma, apenas um covarde que não teve tempo de pensar antes.