Por dentro do Pavilhão - Parte 1

Há muito tempo que vale qualquer sacrifício para estar na Festa do Divino. No passado, acho que o mais grave que fiz foi “ressuscitar” os meus avôs, inventar que eles estavam com a saúde abalada, sobre uma cama, e dizer que poderia ser o último contato com um deles. Forma infalível que encontrei para não tomar falta quando estudava na Escola Técnica, aqui no Barbalho, em Salvador.

O ônibus da Real Bahia saia ao meio dia. Tinha mesmo que filar a aula de 11 horas, descer a Ladeira do Funil e paletar apressado até chegar à antiga rodoviária da Sete Portas. A viagem era sempre acertada para a quinta feira – cada um inventava as desculpas esfarrapadas. Chegávamos em Poções às 22 horas e descíamos na velha agência. Era quebrar a “quina” do cartório e a gente já estava dentro da festa. Nessa hora, a novena acabara e a filarmônica ensaiava os primeiros acordes. A mesa do leilão estava pronta – lá vem a Jurubeba Combosta!

Agora, em 2008, resolvi viajar na noite de quarta feira sem precisar condenar ninguém. Assumi o compromisso com a turma de Poções para ajudar nos últimos retoques dos preparativos do pavilhão. Na verdade, ajudei mais nos palpites. Abrimos a primeira cerveja perto de meio dia, na hora que o carpinteiro pregava umas velhas tábuas para montar um pequeno palco. Nelito supervisionava a empreitada.

Estava na companhia de Pancho, Nego Vando e Jorge de Duca. Pancho, impaciente, toda hora se ausentava para comprar cerveja Caracu no vizinho. Bendita hora que lembramos da excursão da quarta série, em 1971. Fomos parar no Bola Preta da Cinelândia, no Rio de Janeiro, recordando o baile e o desfile que nos foram oferecidos. Não parou por aí. Era a vez de lembrar o placar do jogo Botafogo e Grêmio que assistimos no Maracanã, em companhia de Dr. Irundy Dias – 2x2. Lembranças demais e Vando enchia os olhos de lágrimas em cada detalhe que era dito.

Não durou muito e o número 68 recebeu a visita do número 30. Quem não sabe, é assim que velhos companheiros do Tiro de Guerra são lembrados - pelos números. O 30 é Nildinho Barbeiro, que passou no pavilhão pra tomar uma “gelada” e contar as histórias do cabo Vando, o 68. A conversa foi parar na lembrança do velho Daniel Rosinha.

O Nego Vando prometeu aparecer todos os dias. Sumiu e não foi visto mais durante a Festa.

No final do dia, o encontro foi com Jânio Barriga. Parelha difícil - eu teimava que o nome do parque infantil era São Jorge e ele insistia no nome do parque Ouro Verde. Nós dois estávamos certos, cada parque teve sua época. O papo fica sério quando os olhos carregam-se de lágrimas, é hora de lembrar de tempos idos, das amizades e da importância de cada uma delas e o benéfico em relação aos dias de hoje. Em resumo, basta um aperto de mão (e uns copos de cerveja também ajudam), para invocarmos a lembrança do passado

A noite de quinta feira foi longa e reunimos numa mesa a velha guarda composta por Moacyr Magalhães, Ricardo Benedictis, Beto Nápoli, Jorge Dantas, Roberto Dantas e outros que circularam naquele espaço.

Na sexta feira, após a chegada das Bandeiras, o Pavilhão ferveu. Havia ex-prefeitos, prefeito, vereadores e prefeituráveis de todos os partidos, dentro e fora dele – fiquei surpreso em ver a união de todos eles, talvez por não saber identificar as estratégias dos apoios. O espaço ficou pequeno e todos eles concordavam em um ponto: “ano que vem o pavilhão será maior!”

Tirar essa turma de cima do palco não foi fácil. O medo era que a frágil estrutura pudesse desabar e “adeus” ao lugar dos músicos e da bandinha.

Em todos os momentos tivemos a oportunidade de ver pessoas tradicionais de Poções no espaço. Naturalmente, o Pavilhão serviu de abrigo para a agressão sonora daqueles “infernos ambulantes”. Mas isso eu escrevo depois, na segunda parte de dentro do pavilhão.

Um abraço,

Lulu Sangiovanni

luiz.sangiovanni@gmail.com