A ÚNICA NEGRA

Aquele da foi realmente especial. Ela estava vestida com a roupa preta e cheia de orgulho. Seu rosto demonstrava espanto e felicidade extrema, as bochechas brilhantes faziam lembrar a meninic da garota. os olhos firmes eram fixos no diretor que logo iria chamá-la para o discurso.

Os pais da menina, negros, não podiam estar mais felizes. Quanto esforço, quanta economia, mas ela estava lá; sim, eles haviam coseguido. Um sentimento de missão cumprida brotou no coração dos vlhos a pono de seus olhos encherem de lágrimas. Apnas uma delas desceu do rosto do pai e escorreu até eu queixo largo. A mão calejada levantou-se e enxugou a lágrima morna de felicidade.

Enfim ela foi chamada e, num passe de confiança, dirigiu-se ao microfone. Não aparentava nervosismo, nem pressa. Suas mãos seguravam apertado o discurso que perdera semanas escrevendo. Já o lera e relera, agora só precisava fazê-lo novamente. Antes, porém, olhou para todos; era negra, a única negra que conseguira formar-se. quanto orgulho, quanta felicidade!

Num êxtase sentiu-se fora dali e seus pensamentos vagaram para bem longe. Estava ela, com o cabelo todo trançado observando os pais, por detrás da porta, fazendo as contas dos gastos do m~es, quando quase sempre faltava dinheiro. O pai então abraçava a mãe e dizia que tudo iria dar certo.

Voltou a si e começou a ler. Enquanto lia, as lembranças de toda uma vida lhe vinham: como poderia ela ter conseguido? Não fora fácil, mas lá estava ela, fomando-se, vestidade pret, a única negra.

Aquele aniversário de cinco anos ela nunca esquecera. Os pais a levaram num bar, pediram um pedaço de bolo, contaram as moedas. A mãe tirou uma vela da bolsa e colocou na fatia. Ali mesmo cantaram parabéns e a abraçaram, com tanto amor, com tanta ternura que a garota sentiu-se a mais amada e protegida do mundo.

O discurso ia sendo lido, de repente uma lágrima da menina escorreu. Ela parou, enxugou a lágrima, respirou fundo, olhou para os pais e disse: muito obrigada, não teria conseguido sem vocês.

Saiu do microfone em direção aos velhos e experimentou novamente o abraço, aquele do seu aniversário de cinco anos, aquele sem o qual não teria conseguido. lá estava ela se formando, a única negra.