E agora?

Sem qualquer espécie de inspiração, liguei o computador e abrí o Word. Não tenho a menor idéia do que vai ser escrito em seguida. Realmente estou confuso, sem assunto, o pensamento disperso, não consigo concentrar-me. Mas vou continuar escrevendo. Como se eu estivesse pensando em que deveria pensar.

São tantas as coisas que nos passam pela mente em certos momentos que não se consegue fixar o pensamento numa delas. Não deveria tentar escrever nessas condições. Mas algo me impele a prosseguir. Não tenho nenhuma noção de como começar, que assunto abordar e, muito menos, de como concluir.

É como se eu não estivesse acordado. Tal qual quando se tem um sonho do qual não se consegue lembrar. Acorda-se, sabe-se que sonhou mas não se pode clarificar o sonho. A sensação é a de que a nossa mente está numa viagem sem destino, atravessando lugares nunca antes visitados e sem a menor noção de localização.

Por maior que seja o esforço que esteja fazendo para concentrar-me, o cérebro não obedece. Curioso, se é o cérebro que nos comanda as ações, neste momento ele está, aparentemente, sem nenhuma capacidade de controle.

Estou, por assim dizer, tentando colocar na tela um pensamento vago, descontrolado, disperso, ao mesmo tempo em que me esforço para que esse pensamento tenha um foco. Talvez eu esteja perturbado por algumas preocupações que me impedem de organizar a minha mente.

Aí, chego a um impasse. Como prosseguir se não tenho na mente algo específico para abordar e, assim, poder escrever sobre esse algo? Deveria deletar tudo e, em outra ocasião, quando a mente estiver tranqüila, tentar pensar e escrever alguma coisa que faça sentido?

Provavelmente seria o melhor a fazer. Mas alguma força me leva a insistir. Os dedos estão ávidos para comprimir as teclas e eles não estão preocupados com o meu pensamento. Sinto que não vou conseguir chegar a lugar algum. E como será para quem for ler o que estou escrevendo? Vai achar que estou fora das minhas faculdades mentais? Talvez esteja, pelo menos neste exato momento.

É uma situação crítica. É como um caminhar na escuridão. Não se sabe onde estamos pisando e nem aonde vamos chegar. Ainda bem que, estou certo, é apenas um momento, uma fração da minha vida. Se não for isso, então eu estarei realmente enlouquecendo. Mas não estou. Não posso estar. Eu sempre tive bastante clareza dos meus sentidos, do meu raciocínio, do quê e como fazer ou não fazer.

Acho que vou parar. Estou pensando em continuar a leitura de um livro que me foi presenteado. Mas não vou ter condições de absorver o que irei ler. É inútil. Não há nada que possa fazer nessa situação. Talvez ouvir música. Sim, acho que é uma boa idéia. A música tem o poder de nos acalmar. Gosto de músicas românticas, principalmente daquelas que me fazem recordar os tempos de juventude.

Não. Tenho que encontrar uma solução para a enrascada em que me metí. Ouvir música não me livrará dessa situação de pensamento difuso. Estou impaciente. Escrever pode ser um remédio para tais circunstâncias. Mas quem vai tolerar a leitura de um texto sem pé nem cabeça? Eu não toleraria.

Como já escreví diversas linhas, sem o menor sentido, já estou ficando cansado. Vou encerrar por aqui. Vou fazer um lanche e tentar colocar as idéias em ordem. Cheguei à conclusão que inspiração é fundamental. Sem ela, ficamos totalmente incapacitados para criar. É como tentar atravessar um rio sem saber nadar. Quem sabe em outro dia eu seja capaz de escrever alguma coisa que possa interessar? Os meus dedos que me desculpem mas eles terão que se acalmar. Sua avidez terá que ser contida, quer queiram ou não, em benefício de uma causa nobre, qual seja o respeito aos eventuais leitores destas malfadadas linhas.

Bem, depois dessa brilhante conclusão a que cheguei, resta dar um título ao que seria uma crônica. Pensando nisto, veio-me uma inspiração: E agora?

Augusto Canabrava
Enviado por Augusto Canabrava em 05/02/2006
Reeditado em 11/10/2008
Código do texto: T108361
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