UM ANJO CAÍDO DO CÉU

- Mãe, estou indo para a musculação! Quer carona para a hidroginástica?

- Obrigada, José Felipe. Gosto de ir de bicicleta. Tchau! Vá com Deus!

Bom dia, Eugênio! Faça-me o favor de abrir a garagem.

Olá, minha “cabrita” verde! – iniciei o monólogo de sempre. – Vamos? Não! Primeiro vou pedir a proteção do alto: Maria Santíssima, cubra-nos com seu manto. Jesus, derrame sobre nós o Seu sangue que rolou na cruz. Amém.

Na calçada do DNER, na avenida Beira mar.

- Ué?! Por que esse ciclista parou ali? - pensei. - Vou tentar passar pela beiradinha da calçada. Ai! Ai, ai, ai!

- Nossa!!! Caiu, dona?! Machucou?! Senta aqui no meio-fio!

- Não foi nada, moço. Por favor, ligue para este número e avise lá em casa. E pensei: acho que quebrei o pé. Senhor Deus, ajude- me. Faça a Sua obra

- Meu Deus!!! Fabiano e eu a vimos sentada no chão e voltamos!

- Obrigada, Gelcely. Não estou sentindo nada. José já está vindo por aí.

- Mamãe!!! A senhora está bem?! - disse Gisele apavorada.

Nisso, parou uma caminhonete branca de cabine dupla.

- Bom dia! Chegou a sua ambulância!

- Mãe, a senhora conhece esse homem?

- Não, minha filha. Nunca o vi na minha vida.

- Eu sou médico ortopedista e sua mãe quebrou o tornozelo. Coloque-a no meu carro que a minha clínica fica logo ali.

Todos se entreolharam. Meu marido chegou correndo e quebrou o silêncio.

- O que você foi arrumar, meu bem?! Está doendo?

- Não, não! José, o motorista está dizendo que é ortopedista e que...

- Vamos! É urgente! Entrem no meu carro! O que estão esperando?

Oitocentos metros depois, chegamos ao Centro Médico de Bento Ferreira...

Foi tudo muito rápido. Levaram-me logo para tirar radiografia. Tive torção e três fraturas. Resultado: cirurgia. E agora? Eis a questão.

Silêncio de novo. Fechei os olhos e pedi: Senhor, faça o que for melhor.

Graças a Deus correu tudo bem. Só fiquei triste a noite quando o meu marido foi para o nosso curso de informática, no SENAC. Ele foi contrariado, mas não podia faltar. Chorei escondido. Na volta recebi beijos dos colega e até do professor.

No outro dia, na troca do curativo.

- Doutor, o senhor é um anjo caído do céu.

- Eu não! Primeiro, não sou nenhum anjo e segundo se eu cair do céu me esborracho todo.

- É sim. Na hora em que eu estava lá no chão fragilizada, sentindo-me a menor de todas as criaturas, não poderia ter passado um oftalmologista, um psicanalista, um neurologista, um ginecologista ou outro “ista” qualquer? Mas, não. Passou logo o senhor, que é cirurgião e professor na UFES.

- Isso não é nada, D. Anna. Outro dia vi um menino pobre, capenga, pulando de um pé só, pois sofrera paralisia e lhe perguntei se queria ficar curado. Pedi que me procurasse no Hospital Infantil.

- E aí, doutor José Fernando?

- O guri está ótimo! Está jogando até futebol!

- E o que os seus alunos acham disso?

- Eles gozam com a minha cara todas as vezes que me atraso e dizem: aí, né, professor Duarte? Estava procurando um acidentado para socorrer, hem!

- Doutor, que bom seria se os seus colegas fossem iguais ao senhor!

Anna Célia Dias Curtinhas