A venda do morro

A coisa aqui no morro a coisa não ta legal, é que a tal de milícia entrou aqui e fez nascer do beco do Zé um rio de sangue, no início achei bom pois os traficantes daqui eram homens muito ruins, entravam nas casas, espancavam, estupravam, era uma política onde o traficante era o Rei. Quando a milícia chegou houve por parte de alguns moradores até festa, mas hoje, trinta dias depois da milícia ter tomado o morro a conversa é outra, eles entram nas casas e cobram dinheiro de todos os moradores, dizem que é para manter a segurança, nos obrigam a contratar seus serviços de TV, e se não aceitarmos somos vistos com maus olhos. Continua a política do medo. O chefe da milícia vive como um rei, tem até arem, não tem mais venda de droga, mas em compensação temos que pagar todo mês uma grana para podermos viver aqui. Não sei se a vida é pior ou melhor, sem eles, as vezes fico pensando onde esta o poder público, pra quê tantos impostos, e olha que eu pago os meus em dia, mas não entendo o porquê de tanto descaso.

Ontem ouvi que a milícia iria vender o morro para uma facção, acho que era o ADA, mas não tenho certeza, ou seja, agora faço parte de um comercio onde eu sou umas das peças a ser vendida, sou parte desse escudo que é usado pelos bandidos para se esconder da polícia. Pelo amor de Deus me respondam, onde está o poder público? A muito tempo há uma guerra no Rio de Janeiro , nós que moramos aqui fazemos parte dela, mas como escudo. Não temos para onde ir; nascemos, crescemos e vivemos dentro desse terror, mas o que está acontecendo está fora de compreensão.