Sôzindiozinho e kelo domi de keka.

O título deste texto soa como expressão de alguma língua aborígine ou algum dialeto desconhecido. Mas, na realidade é a expressão de meu filho Jordão com dois anos e três meses, cujo significado será esclarecido mais adiante.

Numa dessas noites minha mulher Cristina quis tirar a cueca do menino para lhe colocar a fralda noturna e depois o pijama. Ele começou a se opor a essa situação. “Num quelo, num quelo, não mamãe, num quelo”, segurando sua cuequinha para não ser tirada. E a mãe insistindo, alternando autoridade e docilidade. Mas, mesmo assim o curumim se mantinha irredutível para ficar só de cueca, como passa a maior parte do dia em casa. Resolvi intervir como mediador. “Meu filho – contemporizando – tira a cueca e veste a fralda para não urinar na cama”. E ele replicando: “Não, num quelo, num quelo”. Refleti e vi que estava lidando com um amazônida turrão, descendente dos antigos habitantes desta abençoada terra que durante milênios aqui viveram nus. Por causa do clima equatorial quente e úmido eles não precisavam de roupa.

Na Amazônia a maior parte do ano a temperatura varia de 27 a 35 graus. Então, pra quê roupa? Mesmo diante de torrencial chuva não faz frio, apenas uma agradável temperatura. Aí ponderei: “É, Cristina, ele é um indiozinho e índio não gosta de muita ou quase nenhuma roupa, deixa ela ficar só de cuecas”. Sentindo-se apoiado Jordão pegou o gancho e disse à mãe “Sôzindiozinho e kelo domi de keka”. O significado evidente: sou indiozinho e quero dormir de cueca.

Daquela noite em diante, com algumas raras exceções, o ele dorme só de cuecas e não molha a cama. E nem a rede, pois, como bom nortista não dispensa uma rede, revezando com a cama durante a noite. E quando eu e minha mulher, de brincadeira, queremos provocá-lo e dizemos para ele vestir fralda noturna a sentença vem imediata: Sôzindiozinho e kelo domi de keka.

Belém-PA, 23/05/2007