A CHAVE DA CADEIA

Saímos de Belo Horizonte para passar as férias em Nova Almeida no Espírito Santo. Com o “fusca 1300” carregado de fantasias de praias ensolaradas, fraldas descartáveis, berços, bicicletas, supermercado completo para 15 dias, lá íamos nós enfrentar 500 quilômetros de estrada.

Lígia, grávida de Frederico, Henrique e Murilo brigando ao longo da viagem no espaço que sobrou no banco de trás. Todos sonhando com o mar.

Na cidadezinha o tempo era dividido entre ir aos bares das praias e aos bares da cidade. Tomando grandes goles de pinga com raízes, contando histórias.

Em uma tarde, fiquei sabendo que em Biririca, lugarejo perto de Nova Almeida tinha um mangue de onde saiam ostras maravilhosas.

Peguei o Fusca, quase zero, e arranquei cedo entrando em uma estrada de terra com destino a Biririca para comprar ostras.

O lugar tinha uma rua só. Na ponta de cá um bar, na de lá, uma igrejinha. Parei na ponta de cá.

Perguntei sobre como comprar ostras e o dono do bar disse para esperar que o “homem das ostras” não iria demorar.

Tomei uma cachaça com peixe frito, outra com ovo cozido e acabei com o tira-gosto do local. Nisso apareceu o companheiro esperado. Descalço de calção surrado, chapéu de palha bastante usado. Curioso, o homem me atendeu.

“O senhor vende ostras?”

“Vendo sim, mas só em terças”.

Pensei que deveria ser uma sacola e perguntei: “Quanto?”

Ele deu um preço pela “terça”. Lembro-me que era valor equivalente ao preço de três ou quatro cervejas na praia.. “Baratim demais da conta” pensei.

E para não dar tempo dele aumentar o preço falei:

“Me traz quatro terças”.

Selamos o trato com uma pinga e ele marcou para o dia seguinte a entrega das ostras.

No horário marcado lá estava eu e o meu fusca, na ponta do lado de cá. Passou um tempinho, aparece atrás da igreja o meu vendedor, puxando pelo cabresto duas mulinhas, cada uma com dois balaios no lombo. Eram as minhas “terças”.

E como trato é trato, abri o fusca e ele foi entornando ostras. Enchi o porta malas, o espaço atrás do banco traseiro e não deu. Dobrei o banco e fui derramando ostras sobre ele. Abarrotei também o vão destinado às pernas e por fim, enchi de ostras o banco da frente do carro só ficando espaço para dirigir. O cheiro era uma delícia.

Em Nova Almeida consegui com o Marcos, primo da Lígia, dono de um restaurante, dois panelões enormes. Um ficou sobre o fogão da casa e o outro no fogão de lenha improvisado no quintal. Ambos cozinhando ostras.

O cheiro de ostras cozidas enjoava a Lígia que vomitava sem parar. Quando parava queria me matar.

Ela, passando um mal terrível ficou do lado de fora da casa. Os meninos reclamando. Mosquitos chegando aos montes. Eu trabalhava rápido para por um fim na situação.

Fiz ostras ao vinagrete, torta de ostras, arroz de ostras, caldinho de ostras e as ostras não acabavam.

Foi aí que tive uma idéia. Fui à delegacia de Polícia atrás do delegado Virgílio, meu grande amigo e indaguei:

- “ Doutor Virgilio, os seus presos já almoçaram? Ainda não? Ótimo. Você, os guardas e todos os oito presos estão convidados para ir agora lá em casa participar do festival de ostras. E tem mais. A cerveja é por minha conta.”

De noitinha encerrei a festa quando desapareceu a última ostra. E lá foi a fila de homens cambaleantes, puxadas pelo delegado, sargento, soldados e os oito presos, voltando para a delegacia, cantarolando Noel Rosa, empanturrados de ostras, pinga, cerveja e violão.

Demorou uma semana para fazer as pazes com Ligia!