EU ONTEM FUI DEMITIDA.
ANA MARIA RIBAS BERNARDELLI.
 
O corpo produz seus próprios medicamentos e Jesus ainda fala na terra, por parábolas. Duas afirmações aparentemente antagônicas, mas que na minha experiência de ontem - e de toda uma vida - parecem ter algo a ver. Ou não?

O corpo produz seus próprios medicamentos quando permitimos que ele funcione de maneira adequada, quando não o sobrecarregamos com toxinas nocivas, quando comemos com sabedoria, e fazemos escolhas saudáveis à mesa. É simples assim. 

Perguntaram-me se faço uso de  Emedeen, um medicamento importado que não conheço bem,  mas sei que é um repositor de vitaminas e sais minerais.  Eu disse que faço uso de frutas, legumes e grãos integrais. 

Como também ( do verbo comer) as outras coisas que gostamos tanto, e que não fazem parte da lista que citei acima: um pouco de cada coisa,  com equilíbrio. Todos os dias escolho frutas e legumes de várias cores, preferencialmente aqueles que não gosto, e jogo tudo na centrífuga: faço um suco e tomo, sem sentir o sabor - tomo como remédio. O que gosto, saboreio, devagar, aos pedaços. Com isso, dou ao corpo a chance de ser mais saudável, mas caso adoeça, certamente, ele produzirá seus próprios medicamentos. Assim, muitas vezes, uma doença incipiente é debelada e nós nem sabemos que o foi. 

Jesus ainda fala na terra, por parábolas. Ontem ele falou comigo. 

 São dois núcleos bem distintos esse que me propus trazer hoje, como tema do dia,  e não faço a menor idéia de como vai terminar, a não ser pela exclusão: o corpo, bem tratado,  responde com saúde, e nos traz a sensação de bem estar;  Jesus, para falar na terra, nos faz passar situações às quais  reagimos  com perplexidade,  mas que precisamos engolir. Como a vitamina insonsa de cada dia. Que no final reverte em saúde para nós.

Reitero, porém que é uma perplexidade apenas inicial, que depois vai abrandando, abrandando, até ceder lugar à aceitação total. Da forma como o corpo aceita a vitamina, o espírito aceita o arranjo soberano de Deus.

Mas que poder tem esse brado repentino que nos advém na metade do caminho!  Ontem, eu estava indo para o lado que vou sempre, todas as terças feiras à noite.
 
Imbuída daquela que pensava ser a minha missão de toda terça feira à noite, eu levava convidados comigo. Raramente levo convidados. Mas, por uma dessas ironias finas, ontem,  levei. Eu disse a eles: “hoje vocês vão me ouvir pregar.” Será que disse com algum orgulho? Não sei!
 
Eu só sei que não se levam convidados para a casa alheia, pensando que a  casa é sua,  mesmo que essa casa seja chamada a casa de Deus. Também descobri  que nem sempre o que se pensa estar fazendo- de bem - para os homens está no centro da vontade de Deus. 

Na verdade, não foi ontem que  Deus  falou comigo por parábolas: a parábola veio antes, uns quinze dias antes. 

 Naquele dia, a moça de cor azeviche e grandes olhos negros, disse-nos assim:
 - "Jesus ainda fala por parábolas. Eu estava trabalhando em tal lugar. Senti que não era para ficar mais ali, e pedi as minhas contas"- ela contava a uma platéia atenta, de mais ou menos 20 pessoas. - " Em seguida, arrumei outro trabalho. Fui contratada para trabalhar em outro lugar, e um mês depois, mandaram-me embora. Mas eu tenho certeza de que Jesus estava tanto no meu pedido de demissão voluntária, como na minha demissão involuntária. Eu sei que isso que aconteceu comigo, é Jesus falando em  parábolas.  A comida da minha despensa está acabando, mas eu estou esperando Jesus concluir a parábola que ele escreveu para mim.  Eu sei que a parábola ainda não acabou" - em lágrimas, ela encerrou a sua fala!

Ficamos todos gravemente atentos: Era um grave falar para todos nós! A consciência do divino tão próxima, nos manteve por alguns momentos, reverentemente mudos e silenciosos. 

Não sei quantos receberam o falar de Deus, de uma maneira pessoal, mas eu sabia que Deus havia acabado de falar pessoalmente  comigo. Eu sabia desse jeito que sabe tendo  certeza,  mas ainda espera que não, que talvez tenha sido só um presságio, algo que viera de mim e não dEle. 

Passei parte da noite meditando, orando, pedindo confirmação: eu tinha três pontos de pregação e Deus estava mandando que eu entregasse o primeiro. 

 No dia seguinte, capitulei e  fiz o que precisava ser feito: entreguei aquele ponto de pregação. Que não era meu e para o qual eu havia sido apenas convidada "por uns tempos." E o tempo se passara e eu até tentara devolver, mas disseram-me que não, que ficasse mais. E mais eu fui ficando. Até que naquela noite, a cintilância de Deus, somada a outros acontecimentos que eu já pressentira- porque o Espírito de Deus revela- fizeram-me "pedir demissão" a quem de direito.
 
Que foi aceita no ato. Bingo: a parte hum da parábola se cumprira!

Mas a parte dois se previa tão dolorosa: ser demitida! Preferi ignorar. Prosseguí,  fazendo o que fazia sempre: pregando todas as terças feiras a noite, em outro local!  

Ontem, terça feira, quando me dirigia para esse local, como faço todas as terças feiras, há cerca de 4 meses, fui demitida. A parte dois da parábola cumpriu-se.

Não fui demitida da maneira tradicional,  mas dessa maneira misteriosa que nos faz ver o invisível e em vendo, "enfiar a viola no saco e ir cantar em outro lugar."  
 
Quando cheguei alí, (com os meus convidados!)  descobri que havia outro pregador ( de outra cidade ),  para ocupar a tribuna. Que não é minha, mas que toda terça feira, estava sendo minha. Esqueceram de me avisar. Um telefonema bastaria, mas esqueceram de telefonar. Na verdade, Deus fez com que esquecessem, porque se  telefonassem, eu permaneceria “ad eternum” aonde Deus não queria que eu permanecesse mais. É simples assim.
 
Quando cheguei ali, vi algo de diferente no ar: a congregação estava em festa. Muitos carros, muitos convidados, muita divulgação: diferente do que acontece todas as terças feira, quando a frequência é apenas regular. Santo de casa nunca fez milagres!
 
Quando cheguei ali,  também  pensei: “tudo isso para mim?” Foi o “raciocínio” do burro que conduziu Jesus pelas ruas de Jerusalém ao ouvir a aclamação do povo. A aclamação era para Jesus, mas que importante sentiu-se o burrico, com toda aquela gente que, repentinamente, o rodeara.    Eu fui a burrica da noite.

Quando cheguei ali,  o constrangimento foi recíproco: da parte deles e da minha também. Mas a humilhação involuntária faz parte do processo de Deus para nos tornar mais semelhantes a seu Filho. Eu teria que ser demitida e nunca se ouviu dizer que demissão fosse algo glorioso.
 
Assisti ao culto, sentada no meio do povo,  e Deus ainda deixou a sua assinatura em um  detalhe: um dos irmãos que usou a tribuna,  leu exatamente o texto que eu iria pregar em Isaias 40-  "Mas os que esperam no Senhor, renovarão as suas forças. Subirão com asas como águias; correrão e não se cansarão, caminharão e não se fatigarão." 

Só eu sabia que essa seria a Palavra da noite. Que para mim, continuou sendo a Palavra da noite. Se o culto terminasse ali, eu já estaria alimentada.
 
O que isso quer dizer? Quer dizer assim: “Filha, eu, o teu Deus,  sou o único responsável por tudo!" 

 Nesta semana, no mundo, quantos trabalhadores estão sendo demitidos? Eu sou um deles!  A sensação é ruim, o "ego" esperneia. Não fomos programados para a diminuição moral.  Seja no trabalho secular, seja no trabalho espiritual.

Como na parábola, minha despensa moral está vazia:  que sensação desagradável quando nos jogam num canto qualquer, como um sapato velho.
 
Mas a  despensa espiritual está cheia, abarrotada. Como vou distribuir esse alimento, é tarefa que não me compete nem sequer arrazoar. O que mais me resta  fazer a não ser aguardar, confiar, viver e descansar? Ele é Deus!

A parte mais difícil talvez seja essa: esperar que Ele escreva o que faltou na parábola. Isso exige fé. E fé é matéria de que sou feita na íntegra. Quase na íntegra. 

Quando cheguei ali, estava feliz, desse feliz acostumado a uma regrada felicidade. Quando saí dali, estava triste, desse triste acostumado a uma regrada tristeza. 
 
Mas a noite passou e o dia amanheceu. O corpo produz seus próprios medicamentos e nesta manhã, parece estar saudável. Creio que, por estar bem nutrido,  vai continuar produzindo as endorfinas que preciso para vencer este dia. Um dia de cada vez, essa é a minha máxima de vida. Com uma boa dose de imunidade contra as gripes e contra as glórias da humanidade. Deus me protege de ambas.  

Jesus ainda fala na terra e já arrisco uns exercícios de previsão de como a parábola vai terminar. Só tenho uma dúvida: de que jeito  vai começar aquilo que Jesus precisa terminar? 

Essa dúvida já é a fé em exercício.