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O GRITO DE LIBERDADE DOS SENTIMENTOS CATIVOS
 
  
“Se abra para o novo”. Esta frase, dita por uma pessoa amiga, ecoou pelo meu cérebro na madrugada inteira. Ela foi a responsável pela visita, sem cerimônia, da insônia ao meu corpo cansado. Nem mesmo a música ligada no aparelho de som conseguiu abafar o volume amplificado do som dessas palavras. Travei uma guerra com os meus travesseiros e minhas cobertas na tentativa de tapar os meus ouvidos. Nada adiantou. 

Os pensamentos reverberaram em minha cabeça em função da rebelião dos meus mais íntimos sentimentos, provocada pelo impacto da frase dentro de mim.

Exausta e nervosa levantei-me, fui beber uma água e comecei a rezar. Logo percebi que a tentativa era em vão. Cheguei até a me sentir uma pecadora afinal, todos os meus arquivos internos de orações, naquele instante, haviam sido deletados.

Eu precisava de silêncio e percebi que se não me dispusesse a ouvir esses sentimentos manifestados nas barulhentas vozes interiores, eu não conseguiria dormir. 

Foi quando tomei a decisão de escutá-los, mas não sem antes lhes dar um grito pedindo silêncio. Então, eu lhes disse: está bom, eu cedo. Mas os ouvirei de maneira organizada, darei a palavra a um de cada vez para que eu possa refletir sobre as minhas respostas. Todos concordaram. 

Foi uma reunião sem pauta. Todo e qualquer assunto pode ser aventado. E assim, eu pude vivenciar um dos momentos mais privilegiados de toda a minha vida, percebendo toda a avalanche de tensões, de angustias, de alegrias, de tristezas, de rejeições, de frustrações, de teimosias, de valores ou falta deles, de as boas e más intenções, de medos, de defeitos, de qualidades, de respeito ou a falta dele, de mágoas, de necessidade de reconhecimento e de falta de reconhecimento, de culpas, de saudades, de bons e maus momentos circulantes em todo o meu ser.

Não foi fácil.  Em certos momentos, era como se eu recebesse um soco na boca do estômago. Felizmente, a fonte das lágrimas não estava funcionando, livrando-me do dilúvio emocional. A experiência vivenciada me mostrou o quanto é desconfortável ficarmos diante de nós mesmas olhando nos nossos próprios olhos e para dentro de nós,  reavaliando cada ínfimo sentimento e conceitos de si própria.

É duro descobrir que, em certos momentos de sua vida, você prendeu em uma gaiola a sua “alma passarinho” e a alimentou, deu-lhe água e até a ouviu cantar nesse cativeiro. 

Que você a violentou, privando-lhe da liberdade de voar pelo medo enganador de que alguns sentimentos nunca mais retornassem. 

Logo eu, que detesto animais enclausurados. Logo eu que prezo tanto a própria liberdade e a liberdade de qualquer pessoa. Logo eu, eu mesma, aprisionei os meus próprios sentimentos numa gaiola, ao invés de deixá-los livres na imensidão de minha alma.   

Ainda bem que tive ouvidos para ouvir os gritos de liberdade desses sentimentos que não cantavam mais, que apenas esperavam e ficavam alvoroçados naquele minuto de atenção quando eram alimentados e, que se entristeciam pelo resto do dia recolhidos na sua solidão.

Hoje, ao acordar no amanhecer, eu abri todas as minhas janelas e ao verem a porta da gaiola aberta, saíram voando, cantando, pousando nas copas das árvores da alegria, da esperança. Vez por outra, vieram pousar no parapeito da janela do meu quarto e para minha surpresa, um filhote de afeto pousou no meu ombro trazendo-me pétalas de rosas vermelhas de presente.

Como estou atenta em não  mais aprisionar minha alma,  resolvi me abrir para o novo.