A teoria de vice-maridos

Mais uma teoria. Inventou-a um tal Queiroz, um espanhol de Saragoça, que a si mesmo se apresenta: Sou Queiroz, com Z, à maneira del mio primo, o grande Eça de Queirós.

Não dá para entender que mania foi essa que inspirou ao dito saragoçano tão impertinente parentesco. Pelo que todos sabemos, este Queiroz (com Z etc.), nascido nos arredores de Saragoça, foi aprendiz de funileiro onde nada aprendeu, e depois faxineiro na embaixada espanhola de Lisboa. Seguidamente, aparece trabalhando no Consulado de Espanha em Montevidéu em que dá a entender que é tudo - adido cultural, ofice boy, boy de alugel, telefonista, moço do café e, se necessário, parceiro dos viados da casa. De Montevidéu vem constante a Porto Alegre. As más línguas o dizem passador de cocaína e cafetineiro de meninas menores, tudo para o pessoal diplomático de fala castelhana.

Bem! Nosso destacado Queiroz (com Z etc.), além dos setenta e cinco quilos de carne sadia, tem de aproveitável a hilaridade aprendida e treinada em Lisboa na convivência barata de las muchachas do Bairro Alto. Constante, tece louvores à boniteza do seu nariz adunco de judeu nazista espetado no rosto bolachudo. Amiúde vem a Porto Alegre refestelar-se com o delicioso bacalhau à portuguesa no restaurante Os galos. Como bom espanhol, fala, fala e nunca diz nada ou pouco mais que nada.

Nó do problema: Queiroz (com Z etc.) diz-se inventor da Teoria dos Vice-Maridos. Defende o achado. Vá alguém contradizê-lo! Fica rubro que nem pitanga madura. Eu que o diga! Em bons termos lusitanos, ripostei-lhe que tal sarrabulhada da Teoria dos Vice Maridos, afinal, era, em ideia coisa muito antiga.

Conto-lhe o relato da crônica medieval sobre El Macias, trovador enamorado, que se lembra de fazer versos, angelicamente eróticos, a uma verdejante dama galega. Sabedor da coisa, o ciumento marido lhe manda-lhe aviso que um dia o esperaria para uma peleja. O poeta, imaginando que seria o momento de mais poder, num duelo poético, aureolar a beleza da referida senhora galega, avisa e o espera no adro da igreja. Avisado, o cavaleiro da espanha dependura à cintura a grossa espada, enfia o capacete bélico, esporeia o cavalo e, lança na mão direita, corre a enfrentar o infeliz enamorado. Este corre-lhe ao encontro, pensando na linda garvaia a receber para substituir o surrado gibão de estopa surrada. Porém, o cavaleiro foi logo - zás! -, enfiando-lhe uma lançada tão potente que o infeliz Macias é de lado a lado trespassado e pregado no chão. Enquanto o poeta fica esperneando a rápida agonia, o espanhol desarvora em correria, cantando, aos quatro ventos, mais uma vitória do seu currículo de cavaleiro andante futuro quixote. Para memória do caso, apenas os poetas irmãos louvam o mártir e azucrinam= =maldizem= o exaltado marido, seu cavalo, sua lança, seu elmo e bravura.

Vejam e aprendam os poetas que a falta de tática para a coisa os aconselha a não passarem de coroas devotas do rebanho das crentes, que assim o fazia o medievo poeta goliardo, hoje sem vez, devido à inflação da mocinha universitária, excelente vendedora da mercadoria de alcova.

Pois, nos dizeres de Queiroz (com Z etc.), el Macias nunca foi um vice. Quando muito, um precursor. Vice só ele, Queiroz (com Z etc.), autor da teoria e, atualmente, ocupando, para glória de todas as espanhas, quatro cargos de vice. Acima de mi (reza ele), solo el grande dom Juan. Este dom Juan, entenda-se, não é nenhum nobre mas o femeeiro das novelas, que, no espaço de breves meses, transou com mil e uma das esfomeadas madrilenas.

Todo mundo já decifrou que o tal Queiroz (com Z etc.) se diz inventor da Teoria dos Vice-Maridos. Apenas resta esclarecer que o Queiroz (com Z etc.) fundamenta a geringonça com o melhor da filosofia que diz ter aprendido com os jesuítas de Salamanca onde - dúvida de todo mundo - se formou em filosofia pura. No Brasil, não; mas em Uruguai, terra de parlamentares iluminados como os magalhanes, sivrinos e renones, tem o apoio de três deputados, seus adeptos, que querem oficializar a sua doutrina. Em Montevidéu - ele o apregoa - devido a ele, já se fala em maridoterapia, talamoterapia, chifroterapia, bundoterapia etc. etc.. Breve, terminará seu primeiro caderno do monumental tratado que está escrevendo em língua portuguesa. Os jesuítas da cidade vizinha, a quem apresentou a ideia, pensando tratar-se de qualquer tese moderna santificadora do matrimônio, prometem amplo apoio editorial. Quando, porém, verificam tratar-se daquilo, a indignação foi tanta que o padre Triná borrifou-o com a fúria e a certeza de que ele-mesmo, reitor da escola, caso o pressentisse passar frente à universidade, chamaria o possante cozinheiro para ambos nem lhe deixarem um osso direito da alma diabólica.

O pior é que o Queiroz (com Z etc.), só para arreliar os gaúchos, diz que a teoria dos Vice-Maridos é fato consumado em Madrid e nas urbes mundiais como Paris, Miami, Los Libres e até na sua amouriscada Zaragoza. Nunca em Porto Alegre, devido à muito excessiva devoção marital das prendas gaúchas. Mais: que as bases da sua teoria estão em Eça de Queiroz, el mio pariente, el portuguesito mais impórtante de lo mundo. Tapa-me a boca com a noveleta Alves & C.a, onde o primeiro vice, digno deste nome - o guarda-livros Alves -, apanhado com a boca na botija, se oferece ao aburguesado marido para que este, em duelo de pistolas - a do marido com bala e a dele vazia -, o esfuracasse de lado a lado com tiro certeiro. Claro, tudo terminou numa boa: o marido reconhece a inocência do seu empregado e o presenteia com um portovinho, fabricado nas nortenhas terras luso-durienses.

Tens razão, Queiroz. Contigo e com tua sabedoria, começa a verdadeira Teoria dos Vice-Maridos. Engraçado! Fulano tal? Ah! É o vice da dona Zefinha. Sicrano é o terceiro vice da primeira dama. Lula Trabuco é vice três vezes. Um recém-chegado Artur Mestre que, em transas com negras angolanas, ultrapassara dom Juan - quer ir para Saragoça treinar-se com piranhas espanholas nesse exercício de vice-maridados que diz ser mesmo a sua vocação. Como se disse, Queiroz ocupa quatro cargos de vice-marido: dois, muito baratos, em Montevidéu; um em Porto Alegre; e o mais inflamado, em Passo Fundo, cidade do Teixeirinha.

No momento, ele incrimina a TV que lhe nega uma entrevista. No entanto, o repórter soçaite da revista Ultravê está preparando uma reportagem de primeiro mundo sobre o tema e que a fama vai ser tanta que o adido cultural e o motorista da embaixada o vão forçar à candidatura do prêmio Nobel de ciências democráticas do saneamento familiar ou coisa parecida. Aguardemos. Que a teoria vai pegar mesmo. Contudo, algumas meninas da escola pública do Bairro central querem fazer uma passeata de apoio e dizem que a teoria não foi nenhum espanhol que a inventou mas suas mamãezinhas, cheias de graciosidade para a coisa marital.