Reunião de ex-alunos

Um dia destes fui a uma reunião de ex-alunos. Colegas que fizeram o ginásio comigo. Foi muito gratificante conviver por algumas horas ao lado de pessoas estranhas, que me enchem de intimidade quando reconhecidos em alguma foto dos anos 60.

Depois de algumas horas os assuntos de meninos se esgotaram e aos poucos foram surgindo os homens que deles se apossaram.

Aí a coisa ficou chata e eu fui embora.

No caminho de volta vim pensando: somos a geração que nasceu com os ouvidos apurados para ouvir o clamor da alma, o chamado para viver seguindo nossos anseios genuínos e tivemos a coragem de romper o ciclo modorrento de repetir o caminho de nossos pais, que repetiram o dos seus e assim por infinitas gerações que se transformaram sim, mas gradativamente, devagarzinho, num processo de sedimentação natural, mas nós desencadeamos a mais importante revolução do século passado.

A revolução sem armas e sem bombas chegou surfando nas ondas da liberdade total, desregulamentando todo tipo de controle para sermos nós mesmos, eliminando todo e qualquer limite para viver como nos sentíamos e derrubando as convenções em nome da fidelidade a nossos corações.

Abrimo-nos para um excitante mundo novo que nos embriagava ao som do rock, da coca-cola e da liberdade sexual. E foi ela, a liberdade sexual que irrompeu toda transformação. Ela despertou nossos instintos mais fortes e, como um vulcão, rompeu a grossa camada do puritanismo hipócrita libertando os ingredientes necessários à criatividade. E foi a mulher a grande revolucionária, que teve a coragem de se transformar; ela era a grande cativa.

Esse mundo novo contagiou todos os jovens. No turbilhão, as idéias eram impossíveis de serem administradas e uma avalanche de liberalidades encontrou solo fértil e se propagou tanto e tão atabalhoadamente que os mais ávidos mergulharam naquele lago ainda gelatinoso e se imobilizaram na densidade do sexo, das drogas e das ideologias e ali ficaram cristalizados.

O tempo fez a separação, a decantação, no lago ficou apenas o líquido cristalino da transformação pronto para irrigar as sementes daquela geração que trazia no olhar a alegria do poder. Não o poder sobre os homens, o poder ser, o poder fazer sem a opacidade do medo ou o dourado do alento.

Os mais sensatos absorveram o impacto inicial e, conscientes de que eram um instrumento a serviço de uma realidade maior que os destituiu de carências para evitar a ilusão e lhes adubou com a

vontade para que tomassem iniciativas isentas de qualquer percepção, foram, de vontade em vontade, participar da criação do mundo novo.

E foi com esse espírito e uma luta avassaladora que essa geração transformou o mundo gerando a maior onda de criatividade de todos os tempos nas artes, nas ciências, nas técnicas, nas relações sociais, nos negócios, na economia, nas religiões, na política e não houve canto neste mundo redondo que essa semente não foi semeada.

Mas, quem tinha na alma a liberdade total não podia criar defesas sem se agredir e sorrateiramente, as sementes daninhas do mundo velho foram germinando e gradativamente se enxertando nas sementes do mundo novo criando a semente híbrida que viceja em nossos dias. Mas, aqueles que ouviram o som da rebentação das ondas da liberdade têm dormindo em seus corações, envolta em um delicado tecido de linho, a semente original que não permite a total hibridez e, assim, de quando em quando eles se reúnem em torno do esquife vazio do clamor da alma na vã tentativa de ressuscitar a alegria da liberdade total.

Carlos Campregher

10/2008