Amor de morte

"O amor é paciente, é benigno, o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente..." I Coríntios, 13

Triste semana para o amor, triste semana para o perdão, triste semana para a tolerância, triste semana para o respeito.

Em Joinville, executivo bem sucedido (Como somos frívolos em achar bem sucedido apenas quem vai bem nos negócios, mas isso é outra história.) atira no carro da ex-namorada, é preso e se enforca na cadeia. Mais ou menos simultaneamente, um jovem seqüestra a ex-namorada e uma amiga em Santo André e, após longas 100 horas, é dominado pela polícia, não sem antes atirar na amiga e na ex, que morre no hospital. Em vários momentos diz que seu gesto – o seqüestro – tem o objetivo de deixar as pessoas tristes.

Desaprendemos a amar? Ou nunca aprendemos? Que amor é esse que precisa da posse para sobreviver? Que amor é esse que tira vidas, inclusive a própria, porque a posse já não existe mais? Ter, ter, ter: é o consumismo absurdo e absoluto que toma conta do que há de mais sagrado na alma humana. Não basta compartilhar, não interessa dedicar-se, não vale entregar-se, aquele doce sofrer por amor e para o amor perdeu o sentido. Amor é objeto de consumo que pode ser comprado, usado, descartado, não interessam quais sejam os meios e as formas. O outro interessa apenas para suprir nossas necessidades, preencher nosso imenso vazio que nunca se contenta. E quando não o conseguimos para isso, tudo fazemos e tudo é justificável para consegui-lo. Ferir, matar e matar-se, inclusive, talvez na ingênua crença de tornar-se merecedor dele com a morte.

No filme “Rede de Intrigas”, de 1976, ganhador de quatro Oscars, com Faye Dunaway e Peter Finch, um âncora da TV é demitido e anuncia que se matará com o programa no ar. A audiência sobe para a estratosfera. A sede de sangue, o mórbido gosto pela desgraça fala mais alto do que o bom senso, exatamente como na cobertura do seqüestro de Santo André. Quantas horas a mídia dedicou ao assunto? Foi preciso tudo isso? Em que foi benéfica? Quantos jovens amalucados, a partir da mega exposição dada àquele desajustado, quererão imitá-lo? Não foi o bom senso e muito menos a caridade que guiou a cobertura. Foi uma maquininha que mede a audiência e que pediu: “Mais sangue”. E o bebemos por vários dias.

“Pra onde vai o meu amor, quando o amor acaba?” pergunta Chico Buarque. E se nunca existiu?