Violão e Guitarra

Foi a noite de um violão e uma guitarra.

Seus dedos percorriam as cordas, ora de um ora de outro, tecendo a música ao seu redor, emaranhando a garota que o assistia com olhos ofuscados por tanta luz vinda daquele palco imaginário.

Dedos ágeis, ela pensava que uma foto fechada naquela mão em movimento sobre o fundo negro do violão deveria ficar vermelha, talvez com halos brancos. Ou pelo menos era vermelho o que ela via se semicerrasse os olhos, de tão quente. Os halos seriam por conta da luz própria. Lens-flare.

Trocou por alguns minutos a vida das cordas pelo objeto inanimado que era o corpo da menina em suas mãos. Ela quase perdia os sentidos e se entregava em êxtase. Não respirava no ritmo da música, era instrumento desafinado, não chegava aos pés daquilo que ouvira até o momento. Ainda assim, ele a tocava com devoção semelhante, com delicadeza de estudante e habilidade profissional.

Teve o cuidado de substituir a suavidade de sua voz por outra, de alguém qualquer, só porque música é a sua vida e ele não deveria deixar-se morrer naqueles minutos. É bom ter algo pelo qual viver. Os dois estavam bem vivos, naquele curto espaço de tempo. A música e o músico eram os responsáveis por ele e ela, respectivamente.

Por fim ela quis ficar lá, apoiada como se fosse a guitarra esperando a próxima canção. Não queria substituí-la, porque sabia que era extensão das mãos de seu dono. O dono da música e de seu coração. Viriam juntos ele, seu violão e suas guitarras. Possivelmente sem aquelas meninas de madeira de corpo escultural, ele perderia a luz nos olhos, aqueles que ela gostava tanto de fitar porque brilhavam.

A única vontade que ela tinha era de que aquele momento fosse longo e contínuo. Mensal, semanal, diário. Que ela fosse sua opção de descanso depois do amor que ele fazia com a música.

Mas esta idéia lhe parecia tão distante, tão fora de alcance, que seus olhos embaçavam só de pensar. E com as lágrimas umedecendo sua visão, ele parecia ainda mais brilhante.