Joaquim e a Chuva

Conheci um garoto que nunca tomou um banho de chuva, isso mesmo nenhum, Joaquim, um menino de 11anos, cabelo enrolado, branquinho engraçadinho, parece até meu irmão quando criança, acho que é por isso que ele tanto me cativou, não é porque ele nunca tomou um banho de chuva,nem de brincadeira eu acho.Ele morava em minha rua, uma rua grande de ponta a ponta,com casarões antigos, de cores que variam entre azuis, amarelos, brancos, enfileirados com escadarias, típico de cidade provinciana, a catedral em que aos domingos eu e minha tia íamos rezar, igreja onde fiz minha primeira comunhão, nossa família é católica, um lugar calmo, bonito, sedutor,quando saía às vezes para visitar parentes aos sábados ia para o bairro Benfica e depois para uma cativante pracinha do bairro Otávio Bonfim eu brincava nos bancos,na escada da igreja Nossa Senhora das Dores. A quinta-feira saía para tomar sorvete e comer pastéis com suco oupipoca depois da missa. O mercado São Sebastião onde meu avô me levava aos domingos de manhã para a feira, comprar milho, feijão e laranja, o que eu gostava mesmo era poder sair com ele de carro, sentir o vento no rosto, passear.Toda vez que vovô voltava de viagem trazia um presente para mim, certa vez ele trouxe um pintinho amarelinho, de brinquedo, uma alegria só. No centro havia árvores grandes como igrejas,os baobás, principalmente no passeio público, onde estátuas de belas mulheres posavam para quem passasse, onde jovens namorados, em bancos sentavam para tomar sorvete,eu gostava disso, gostava de viver, andar por aqueles lugares, apreciar as paisagens, ver a tranqüilidade que nos rodeava a beleza das pessoas nas calçadas, sempre todos os dias, todas as tardes, pessoas bem arrumadas, meninas de cabelos trançados, meninos andando de bicicleta, eu no colo da vovó escutando músicas que eu pedia para ela repetir sempre, na loja do mestre André eu comprei meu violão...” os pombos a voar comer o milho e pousar próximo aos poetas que escreviam poesias nunca esquecidas e olhava o mar verde do Ceará, eu olhava o mar, escrevia versos dedicados a amigos imaginários nos fins de tarde em que o pôr-do-sol encantava e tornava o entardecer um raio de sol o melhor horário do dia uma hora gostosa, apaixonante e as seis no radio sempre se ouvia a melodia de Nossa Senhora, um presente para nós. Joaquim era um ano mais velho que eu, ele ia fazer 12 anos na primavera e eu 11 anos no verão, por maisque Joaquim fosse de minha idade nunca brinquei com ele, fiz até um verso que dizia assim:Joaquim liberdade é o seu nome Voa pra bem longe Direto para o Meu jardim Escrevo o que sinto oque quero curar, o que quero mudar até o amanhecer...Sou poeta observo avida, o cotidiano, vejo além.E eu via Joaquim, via além, mas como sou menina minha mãe nunca permitiu brincar com meninos, para ela menina brinca com menina. O olhava da janela, o conhecia mesmo ele não falando comigo, somente sei da história que Joaquim queria tomar banho de chuva, e não podia!Não podia em dias de chuva sair de casa, que como conseqüência ficava triste, uma tristeza que dava para ler em seus olhos, tristeza de Joaquim.A sua mãe dizia que se ele saísse em dia de chuva e ela o visse molhado, ficaria de castigo, sem sair para brincar na rua, preso em casa, preso na Rua Liberdade”Filho de Marisa de 37anos, mãe protetora, trabalhava de dia e chegava toda noite para jantar em casa com Joaquim e a avó Florença de 54 anos, nesta história a idade não importa muito, o importante é que Joaquim queria tomar banho de chuva!A chuva de verão, aquela que vinha de repente que batia nos rosto da gente, quentinha. Ele achava que a chuva vinha das lágrimas de alguém triste que precisava de consolo e ficava na janela olhando de dentro a liberdade dos garotos que ficavam a correr a rua na chuva.Às vezes eu tenho penado Joaquim, que a mãe dele faz isso, fico a olhá-lo de longe, dá vontade de buscá-lo e correr com ele, para nós juntos vermos e sentirmos a chuva, voar para outro lugar, como dois passarinhos, ora, passarinhos não ficam presos na gaiola, passarinhos são livres veja o exemplo do sabiá, voa de galho em galho e não para no lugar!Dois passarinhos no Ceará eu iria lhe mostrar cada lugar que há, tenho tanto pra li dar!Sempre pude tomar banho de chuva, mesmo sendo às vezes escondida eu fugia ao parque para sentir as águas que vinham dos céus,onde sentava no chão, corria com gente que eu nem conhecia, brincava de estrelinha, fazia amigos de chuva! Brincava sem medo,pois era chuva, alegria,brincava até a chuva ficar fraquinha e a gente ficar pedindo para que ela volte até ela cessar, voltava para casa toda molhada e minha avó dizia:- Menina toda molhada, espera ai que eu vou pegar a toalha! Avó é sempre assim, não deixa você entrar em casa molhada se não molha o piso!

Epílogo: Joaquim sempre tomava banho de chuva em seus sonhos!!!

DandaraOlive
Enviado por DandaraOlive em 30/10/2008
Reeditado em 12/11/2008
Código do texto: T1256389
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