A PRIMEIRA VEZ DE UM MENINO DE 10 ANOS

Era um menino tímido. E, como quase todos os garotos de 10 anos de idade dos anos 60, ele nunca tinha feito àquilo com uma garota – seria a primeira vez!

Estava tão nervoso que suas mãos suavam - pareciam o cuscuzeiro da sua mãe após sair do fogão durante o café da manhã. A palpitação do coração imitava o repique da escola no ensaio da fanfarra – acelerado, porém com cadência irregular .

Era tímido! Também, era uma outra época – se melhor ou pior do que a atual, não sei. Que era mais platônica que hoje em dia, isso sem dúvida era.

A razão feminina para tanta ansiedade já estava vindo na direção do quase enfartado mancebo. Ela não andava! Bailava, num requebrado indolente, tendo como palco a calçada da rua onde morava. Trajava um vestido de chita, modesto e bem colorido, recheado com presumíveis anáguas engomadas por baixo.

Era uma morena brejeira – sem retoques cosméticos – e de uma beleza nativa, daquela que deve ter enfeitiçado os primeiros colonizadores lusitanos. Notava-se claramente, que já havia comemorado muitos aniversários a mais que o rapazote.

Ele postou-se no primeiro dos três degraus da escada que dava acesso a sua casa. Ela aproximou-se com um sorriso que parecia estar na face, antes mesmo de nascer. Estavam a poucos centímetros de distância, o que serviu para ele alimentar o seu olfato com o perfume da Alfazema recentemente aspergida naquela pele de pêssego novo.

Agora, ele não poderia mais recuar! Tinha ensaiado para aquele momento por dias a fio – até em frente ao espelho havia treinado. Que nenhum dos seus amigos soubesse disso !

A moça bonita, ainda em movimento, dirigiu seu olhar para o Romeu infanto-juvenil. Ele inspirou um pouco ar, talvez para não desmaiar, deu um sorriso amarelo e disparou com uma voz reclusa:

- Psiu ! Você é linda. Eu gosto demais de você.

Cumprida a missão, nem esperou resposta alguma. Deu de costas, e como se fosse o Almirante Nelson, após vencer a batalha de Trafalgar, adentrou rapidamente em casa com um sentimento expresso de vitória estampado na face imberbe, já pontuada por várias espinhas pré-adolescentes.

Ela, por sua vez, gostou. Sorriu. E saiu com a certeza absoluta de que ainda ouviria, pelo menos mais uns 15 a 20 “psiu’s” durante àquele dia – era a sua média diária de galanteios.

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Sei perfeitamente que cada época tem as suas peculiaridades e os seus maneirismos na questão do trato social. Isso é saudável e rejuvenescedor. Porém confesso que, talvez por incompetência, ainda não me adaptei perfeitamente ao modo com que a maioria dos rapazes aborda a presumível futura namorada. É bem comum escutarmos agora, galanteios do tipo:

- Aí mina? vai rolar? vamos ficar hoje? Tô a fim de te dar um cato! Existem, obviamente, mais algumas pérolas lingüísticas e líricas do mesmo quilate, porém ainda não tive tempo suficiente para decodificá-las.

Por tudo já exposto, eu vou considerar perfeitamente compreensível e justificável se muitos dos que lerem esta narrativa acharem este texto insosso, saudosista e démodé.

Acredito até, que alguns vão dizer :

- Tá me tirando, mano ? Nóis é foda ! As vadias gosta é de dar uns dois, mané ! Se liga !