Ensaio sobre a Loucura*
 
            Os sentimentos são cristais efêmeros, que cultivamos dentro de um pote antigo de barro, onde neles guardamos nossas esperanças de uma vida inteira presente em meio há lapsos de segundos. Somos humanos em meio há um tiroteio na Avenida Paulista em plena duas horas da tarde, num dia escaldante de sol. Temos a necessidade de gritar, até o que incomoda nos outros, há quem um dia estimamos.
            Detenho admirações pelas conexões que nessa vida consegui estabelecer. As que foram quebradas, ainda me causam amargo na boca, mas não da forma que muito pensam por ai. As minhas conexões são muitas e firmes, com a docilidade da infantilidade presente nos atos de uma criança que ainda brinca de ser adulto no mundo da fantástica fabrica de chocolate.
            Fortes conexões que me curtam-circuitam em fios entrelaçados com as partes desmontadas de meu corpo, de uma boneca de cera que um dia foi jogado bruscamente ao chão com muito dó e piedade no coração que um dia pertenceu há um humano. E na transferência do sangue ao ser que não tinha vida, renasceu a fagulha que hoje floresce o jardim onde os pingüins brincam de ser humanos.
            As falanges que me devem ser amputadas do corpo ainda imóvel, passeia pelo mundo submerso ao fogo, contradiz com os fios que ainda não foram cortados dos olhos de quem deseja ver. Fios que querem comandar, fios que querem demarcar território. Apenas fios de um erro completamente alfabetizado, mas que atravancam o caminho.
            O jeito dessa vida não é mudar, mas, aprender recomeçar é a graça de viver. Desenrolar o emaranhado de fios que lhe foi posto nas costas e reconhecer que os erros são fontes de aprendizado. Não há culpa dentre o caminho que resolvi atravessar, apenas fios deixados. Mas a página que já se fora virada, ainda permite que muitos pensem que a temporada de caça foi extinta há muito tempo. Pobres, podres, poetas, que ainda insistem em querer entender algo que já é tão obvio aos olhos.
            Se a menininha resolveu brincar, não foi na freguesia vizinha, mas na sua própria morada. Onde o pé de jabuticaba já floresceu e começou a lhe render os mais belos frutos de uma linda e doce adolescência.  Os fios do fantoche já foram cortados, apenas os fracos insistem em achar que a boneca de cera ainda os carrega.  
Samara Lopes
Enviado por Samara Lopes em 10/11/2008
Código do texto: T1276732
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