CRÔNICA DE AMOR E APEGO - AOS LIVROS

Todo ano é a mesma coisa: dia programado para a Feira do Livro pode contar que vai chover! E não deu outra – batata! Caiu água! Já foi marcada pro início de novembro, e choveu! Noutro ano, a Secretaria Municipal de Educação mudou para o fim de novembro, e choveu de novo. Este ano, foi agendada para o dia 19 de novembro – nem início, nem fim – e, chuáááá... – choveu muito. Enfim, parece que marcar feira do livro em Porciúncula é marcar encontro também com São Pedro no centro da cidade. Êta coisa, sô!

É um dia mágico para a cidade: os alunos de todas as escolas e todas as idades vão para a praça saborear as mais divertidas, ou tristes, ou emocionantes histórias. Quaisquer que sejam são sempre saborosas, porque livros carregam momentos, energia de uns e de outros, de algum lugar, trazendo bagagens para todos os gostos, viajando num tempo que o leitor não sabe, passando por lugares que pensamos nem estar no mapa, respirando ares que não são nossos, vivenciando emoções e sensações inimagináveis...

Ai,... como amo livros!!! Vivo me alimentando de sabores e saberes através da literatura. Livros me alimentam a vida e a alma. E, enquanto a feira anual de livros não chega à minha cidade, vou adquirindo pela internet, por sítios que me oferecem uma infinidade de obras, com descontos super atraentes e opções de pagamento facilitadíssimo! E eu compro sempre... Mas nada, nada supera a relação pessoal com o livro: seu cheiro, sua cor, sua textura, frases que correm das páginas e alcançam nossos olhos, nos capturando não só o olhar, mas querendo ficar entre as mãos e ir embora conosco. Penso que, ao contrário do que imaginamos, são os livros que nos escolhem quando abrimos uma página qualquer e dali uma frase nos capta, nos rouba. Uma palavra nos impressiona. Ou nos repudia.

E esse contato, esse vínculo, essa relação não tem preço, não há descontos nem facilidades para pagamentos que nos tire o prazer desse momento. E hoje, especificamente, a cronista Martha Medeiros me captura já pelo título de sua última obra: Doidas e Santas. Agarrei o único exemplar da banca e não larguei mais, buscando encontrar mais do livro na contracapa, protegendo-o da chuva. E lá estavam as palavrinhas mágicas a me levar a sonhar em estar a sós com aquela delícia.

Tenho uma relação de amor e apego com meus livros que eu sei que não é muito saudável aos olhos de muitos. Tenho ciúme mesmo, sou chata quando empresto (faço mil recomendações, teço um rosário) e me admiro quando leio que pessoas agora estão doando seus livros, colocando-os em bancos de praças, em pontos de ônibus para que outros também leiam e se deliciem com a literatura. Acho linda e admirável a atitude, mas não consigo me desapegar e aderir a essa corrente. E ainda tenho medo de estar numa praça ou num ponto de ônibus e me sentir atraída por algum volume que jogue seu charme para mim, que rasgue seda para o meu ego, que desfile palavras sedutoras diante dos meus olhos e me impulsione a carregá-lo. Aí, meu bem, vou sentir-me proprietária de uma coisa que não é minha e isso é muito feio, senão abominável! Melhor passar longe e correr pra uma livraria, uma banca de usados, ou, se não for possível por estar numa cidadezinha do interior que só tem feira do livro uma vez por ano, correr pra internet, e sucumbir às ofertas sem sabor nem cheiro, mas que certamente prometem um prazer inenarrável e um possível caso de amor daqueles que, mesmo depois de anos, nos contentamos apenas em olhar para ele na estante e rememorar a sensação que um dia ele nos despertou.

Enfim, saí da Feira do Livro debaixo de chuva, agarrada aos 5 volumes (um rombo na carteira!) mas com a melhor das sensações e com a certeza de encontros maravilhosos no feriado e final de semana. Não vejo a hora de me trancar no quarto e ficar super bem acompanhada por aqueles que me capturaram os olhos e roubaram a alma lá na pracinha da cidade. Eu e eles, em intimidade e cumplicidade.