Encéfalo azeitonado - Uma teoria sobre a violência no trânisto

Durante trinta anos desenvolvi uma pesquisa cientifica sobre estresse e violência no trânsito. Inconformado com o comportamento dos usuários de transporte automotores, saí atrás de respostas para tentar explicar a aversão que as pessoas tem por mim e pela minha mãe, enquanto dirijo meu carro. Fiz uma ousada pesquisa de campo, de forma que pudesse interagir fortemente com o ambiente. Para isso, muitas vezes, aliás, quase sempre, atuei disfarçado de barbeiro. Um disfarce que me permitiu transitar no meio, objeto da pesquisa, e assim colher informações de maior qualidade. Graças ao meu excelente desempenho camuflado de barbeiro, consegui informações profundas, tão profundas que eu as chamaria de baixas mesmo, ou melhor, eu diria até que de baixo calão. Tentei de todo jeito deixar minha mãe de fora desse negócio, mas não estava no meu controle e, realmente, ela foi muito citada pelos mais diversos atores do tráfego.

Por que alguém, que sabe ler e escrever, tem carro, sabe dirigir, mora numa capital, usam adesivos no carro para mostrar que “coração” alguma coisa, insiste em me cortar pela direita, dar uma fechada brusca, quase arrancando meu pára-choque, andar devagarzinho na faixa da esquerda e ainda ficar com raiva se eu reclamar? Não entendo. Passei esses trinta anos estudando sobre isso, até que um dia tive um in sight: Estava dirigindo mansa e calmamente quando um cidadão quase que bate no meu carro ao fazer uma ultrapassagem maluca. Resolvi ultrapassá-lo em seguida e quando emparelhamos, olhou para mim e falou (eu vou dar um sic no que ele disse):

_ Filha da puta! (sic) Tão alto que um certo político no DF disse: “quem me chamou?”.

Eu pensei comigo mesmo: “filha??” Como assim? Certo que não falou comigo, senão diria “filho”. Ignorei. Mas meu filho não:

_ Pai o senhor não vai fazer nada?. Pensei e encontrei a resposta, não só para o moleque, mas para mim mesmo, para fechar a minha teoria sobre estresse e violência no trânsito.

_ Filhão, ele quer dar um tiro na cabeça do papai. Respondi no melhor de toda a minha sapiência.

Matei a charada: existe uma conspiração no trânsito desse imenso país com o objetivo de colocarem uma azeitona nos meus miolos. São milhares conluiados, entrincheirados nas vias secundárias para dar o bote quando eu passar numa preferencial. O exército mancomunado tem militantes em cada semáforo, em cada esquina. Posso ver esses Douglas de Brasílias a Ferraris, me provocando como se todo dia fosse dia de fúria. Eles estão esperando somente uma reação minha, por menor que seja. É a senha para efetuar o disparo. Como não sou bobo, fico calado.

Você está pensando que estou brincado? Não senhor, estou falando sério. Tem muita gente na rua atrás de me acertar um balaço na cabeça. Se você acha que é paranóia minha, então me explique por que quando estou dirigindo certinho e alguém faz uma ultrapassagem pela direita e depois fica dirigindo bem lentamente na minha frente e, gesticulando, me xinga o tempo todo? É obvio que é para me dar um tiro. Off course meu camarada.

Tenho um amigo, o Mister, que pode reforçar o meu argumento. O Mister é um cara esquentado, tipo pavio curto, mais grosso que papel de enrolar prego. Anda sempre na companhia de um trinta-oitão. Certa vez ele estava parado no semáforo, no imediato instante em que o vermelho ficou verde, no mesmo milésimo de segundo, o cara de trás buzinou que nem um trem. O Mister, simplesmente desligou o carro e ficou esperando o candidato a presunto passar, já com a arma em punho. Como o buzinador percebeu sua intenção, ficou calado e passou sem nem respirar. Fora o exemplo do Mister, minha teoria também é comprovada pelos vários encéfalos azeitonados nas geladeiras do IML.

Prego batido, ponta virada, essa é a minha teoria.