A devolução

A noite caia como um manto negro sobre Natal a capital potiguar, os ponteiros do relógio de Max apontavam exatamente oito horas.

Como de costume cumprindo as regras do cotidiano da vida natalense Max pegou sua mochila junto com seus pertences, despediu-se dos amigos do curso pré-vestibular, indo de encontro a parada de ônibus.

Subiu no ônibus que estava lotado para ir pra casa afim gozar do descanso merecido que todo estudante brasileiro tem direito.

O ônibus estava tão lotado que as leis da física pareciam ameaçadas, pois dois corpos pareciam sim ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo.

O ônibus fazia seu roteiro costumeiro cortando a cidade, passando por praças, shoppings, escolas e lugares desconhecidos por Max.

O balanço do ônibus embalava as canções que eram escutadas por Max em seu mp3, musicas do Nando Reis que pareciam calhar perfeitamente naquela noite cotidiana e cansada de uma cidade litorânea como Natal.

O ônibus para algumas vezes nas paradas, algumas pessoas dessem e outras sobem.

Quando aproxima-se de uma parada o ônibus acaba passando por um buraco que o motorista não conseguiu desviar e as pessoas esbarram-se umas nas outras.

Neste momento um jovem rapaz que estava atrás de Max rapidamente abriu o zíper da mochila e enfiou furtivamente a mão dentro da bolsa tirando de dentro dela uma carteira, a carteira de Max.

Um dos passageiros grita com toda a força dos seus pulmões “Motorista olha por onde anda, você ta transportando gente e não animais” e acaba embalando alguns passageiros a reclamarem também.

“Transporte público nessa cidade é uma vergonha”, são algumas das afirmações que muitos passageiros faziam no ônibus.

A parada de Max Já estava a vista, o jovem pediu parada e meio espremido pelos passageiros tentava abrir caminho rumo a porta traseira do ônibus.

Depois de ter travado uma verdadeira batalha para sair do ônibus, Max pulou pra fora e respirou fundo como quem quisesse recobrar a vitalidade que perdera dentro do ônibus e saiu caminhando.

Passou pelas ruas escuras e bucólicas que precisava percorrer para chegar a sua casa.

Depois de uma caminhada de mais ou menos cinco minutos, Max introduziu a chave que portava no bolso de sua calça, dentro da fechadura do portão, abrindo-o e entrando.

Max entrou dentro de casa jogou a bolsa em cima do sofá da sala, foi a cozinha, pegou um copo, abriu a geladeira e se serviu com um suco de uva que sua tia fizera para o almoço e para o jantar.

Foi até a sala, colocou o copo em cima da mesinha e ligou a televisão afim de assistir o jornal.

Quando o jornal acabou ele pegou a sua mochila pra ver sua carteira e pegar um cartão de visita de uma loja de instrumentos musicais.

Notou que sua carteira não estava onde ele tinha deixado, foi tomado por uma raiva e lembrou-se do momento que o ônibus passara por cima de um buraco quando estava vindo pra casa.

Já com muito sono e cansado foi pra cama e dormiu sem jantar, acordou tarde, tomou um banho e aproveitou pra lavar da alma a carteira que foi roubada, além de tudo o que ele lamentava é que na carteira não havia nem um centavo e que o ladrão nada ia ganhar com seus documentos.

Vestiu-se e foi pra escola, desta vez mais atento ao celular que guardava no bolso da calça.

Tudo ocorreu normal como todo dia de aula, os três primeiros horários com aulas de historia e geografia o tinham deixado tranqüilo em relação ao vestibular que se aproximava.

Quando tocou para o intervalo Max foi a uma pequena lanchonete que havia perto do cursinho para comer alguma coisa, quando voltava pra perto de sua turma uma mão lhe tocava o ombro e ele seguindo os instintos humanos virou-se para ver quem era.

Um rapaz vestindo calça jeans e camisa regata com cabelos curtos e bem cortados lhe perguntou “você é Maximiliano”, Max meio sem entender e com sua sinceridade que lhe é peculiar simplesmente disse “sim sou eu”.

O jovem rapaz pegou uma carteira e limpando a sua consciência por ter roubado um estudante sem nem um recurso devolveu a Max a sua carteira.

Antes que Max pudesse dizer obrigado o jovem se virou e saiu andando, desta vez com a consciência mais leve e tranqüila.

Max então só pode ver ele se perde no horizonte da parada de ônibus para nunca mais vê-lo.

E assim a devolução foi feita, devolvendo a Max sua carteira e ao jovem ladrão uma tranqüilidade a mais a sua consciência juvenil.

Modesto C. Batista Neto

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