$ TROCO PARA CINQÜENTA $

Estávamos na última semana do mês, portanto, não havia muitos vestígios em meu bolso do salário que retirei do banco no dia primeiro. Restava-me apenas uma nota de cinqüenta.

Não me lembro exatamente qual aula havíamos matado, o fato é que naquele dia estávamos com vontade de comer crepe acompanhado de uma sodinha bem gelada. Assistir aula? Quem sabe depois do intervalo...

Antes do intervalo era bem calmo o movimento nas barraquinhas em frente à universidade, por isso poderíamos comer e conversar tranquilamente, sem nos preocuparmos com a multidão esfomeada que dentro de uma hora ocuparia todo aquele espaço, trombando uns nos outros, impacientes pela demora do lanche, do pastel ou do crepe.

Talvez, estes momentos em que nos reuníamos para comer e bater papo são os que mais sinto falta daquele tempo. Sinto saudades das amigas e amigos que se perderam por aí, em algum lugar distante, onde não estou. Da mesma forma, que eles também não estão aqui e por isso não nos encontramos mais.

Bem, deixemos a sessão nostalgia para outro dia, para dias de lágrimas. Como hoje não é dia de lágrimas, só de lembranças, permitam-me que conte o caso da nota de cinqüenta.

Como havia dito no inicio do texto, eu tinha apenas uma nota de cinqüenta na bolsa e decidimos comer crepe naquele dia, até aí tudo bem, o problema começou na hora que tentei pagá-lo. Enquanto as meninas conversavam, eu comecei a me preocupar com o troco que a moça do crepe teria que me dar. Não havia gasto nem três reais.

Na hora de pagar a conta, apresentei a nota de cinqüenta já imaginando a reação da moça e a pergunta: “Você não tem trocado?”. Não deu outra. Ela me disse que não teria troco para me dar naquele momento, talvez depois do intervalo, quando o movimento era maior. Poderia ter pedido emprestado para as meninas, como elas mesmas me questionaram por qual motivo não tinha feito isto, após meu sumiço de alguns minutos. No entanto, precisava trocar o dinheiro.

Disse a elas que iria ali e já voltava. Entrei na padaria do outro lado da rua e pedi um “Mentos”. Não estava interessada na bala em si, queria mesmo trocar meu dinheiro. Entretanto, ouvi a mesma coisa que já havia ouvido da moça do crepe. Ela também não tinha troco. Minha reação foi devolver o “Mentos”, mas a mulher não quis aceitar, disse-me que poderia pagar depois, que não me preocupasse. Então começamos com aquele jogo em que um fala sim e o outro fala não, até um se cansar e ceder. Desta vez, fui eu quem cedeu.

Não sei exatamente o que levou a mulher a confiar em mim a ponto de permitir que saísse de lá com uma mercadoria sem pagá-la. Raramente aparecia por lá. Ela apenas perguntou se estudava na universidade e pronto, isso já me qualificou para marcar um fiado sem ao menos deixar meu nome. Fiquei pensando se esta atitude era movida pelo pensamento de que mais valia perder algumas moedas do que perder uma provável cliente, já que eu tinha dinheiro, ela que não tinha troco. Penso que foi exatamente isso o que aconteceu, mas eu nem queria o produto, só queria o troco!

Agora, não devia somente o crepe e a sodinha, tinha também o “Mentos”. Então entrei na xerocadora ao lado e fui um pouco mais esperta desta vez. Não comprei nada, só perguntei ao moço se ele trocaria uma nota de cinqüenta. A resposta foi negativa.

Segui em direção a barraquinha de espetinho. Imaginando que dificilmente alguém trocaria uma nota de cinqüenta por trocar, ainda mais quando precisam ter dinheiro trocado para o troco, peguei um salgadinho e apresentei novamente a nota de cinqüenta, a qual ninguém parecia querer.

Mais uma vez ouvi a frase de que não havia troco. Fui devolver o salgadinho e dona do espetinho fez comigo o mesmo jogo de sim e não que a mulher da padaria havia feito, mas agora quem cedeu foi ela. Afinal, eu não queria o salgadinho! Será que era a minha cara de boa menina que fazia com as pessoas deixassem que eu saísse assim, sem pagar? E eu que nem queria comprar nada!

Minha última alternativa era a xerocadora da universidade. Aproximávamos-nos da semana de provas e isso a deixava bem movimentada, um bom local para trocar uma nota de cinqüenta. Procurei na pasta do curso aquela apostila que já havia desistido de tirar, pois provavelmente nem usaria e fiz o pedido. Quando o rapaz trouxe a apostila, como quem não quer nada perguntei se ele teria troco. Para meu alívio a resposta foi positiva.

Com o dinheiro finalmente trocado, voltei à barraquinha do crepe e à padaria para pagar minhas dívidas. No final das contas aquele foi o crepe mais caro que já comi, pois na tentativa de pagar menos de três reais, acabei gastando quase dez.

E você, será que tem troco para cinqüenta?

Dany Ziroldo
Enviado por Dany Ziroldo em 29/11/2008
Código do texto: T1309945
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