Sobre o Natal, de novo

No final do ano passado prometi a mim mesma que em 2008 não escreveria mais nada sobre Natal. Isso porque fatalmente cairia na mesma mesmice de sempre, como o próprio Natal é. Mas não agüentei. Não dá para observar toda essa fúria consumista a minha volta e ficar quieta. E continuo sem entender o porquê de tanta agitação.

Em Volta Redonda, onde moro, já está difícil sair de carro em dias normais, devido à quantidade absurda de veículos nas ruas. Em dezembro, o melhor mesmo seria ficar em casa, bem quietinha, a espera de janeiro. Não se chega à Vila Santa Cecília; não se circula na avenida Amaral Peixoto, no centro da cidade. Sem falar no único shopping – da região também – cujo estacionamento não comporta o movimento de compras natalinas. Enfim, uma roubada sem tamanho.

E tudo para celebrar o Natal, mas eu pergunto: que Natal? Que Natal é esse em que só se lembra do próximo em dezembro; que só se pensa em unir a família em dezembro; que só existe solidariedade com os mais carentes em dezembro; que só se presenteia a quem se ama em dezembro? O que há de errado com o nosso calendário, ou com a gente, que somente no Natal é que nos lembramos que podemos ser melhores?

“Já colocou o pernil no forno?”, “Esse arroz não vai dar”, “Fulana, você trouxe a sobremesa?”, “Tem que mandar assar mais um frango porque esses três não serão suficientes”, “Traz o outro isopor, que neste aqui não vão caber todas as cervejas!” Você, com certeza, em alguma comemoração de Natal, já ouviu alguma dessas frases, ou pelo menos algo parecido. É outra característica do que conhecemos como celebração natalina atualmente. Comida, comida, comida... e muita bebida. Jesus está lá, renascendo, e só se pensa em comer desarvoradamente e beber até perder a noção, “porque é Nataaal!”

Sinceramente, não vejo sentido em nada disso, e não participo e não me envolvo. Reúno-me com minha família, que comete de tudo um pouco desses exageros, mas não consigo entrar nesse clima de irrealidade, de um espírito natalino totalmente desvirtuado. Volto para casa de madrugada e ouço som de axé, pagode, forró, gritaria. Como se fosse um baile de carnaval, pra “beber, cair e levantar”.

Chega-se ao dia 26 com uma ressaca inominável, e toda a vida real chega junto. Irmãos que não se suportam; noras que odeiam as sogras; cunhado apaixonado pela cunhada; maridos que se lixam para as mulheres e vice-versa; maridos que espancam as mulheres; pais que espancam os filhos; filhos que desrespeitam os pais; chefes despóticos; políticos que metem a mão no dinheiro público; funcionário público que mete a mão no dinheiro do povo; criança se drogando na rua; cachorro abandonado pelo próprio dono e assassinado no Centro de Controle de Zoonoses; peixe morto envenenado no rio Paraíba; lixo no rio Brandão e por aí vai. Tudo volta ao ‘normal’, depois do Natal.

Giovana Damaceno
Enviado por Giovana Damaceno em 23/12/2008
Código do texto: T1350085
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