Serviço de vagabundo

Morador de uma rua qualquer, de um bairro qualquer, de uma cidade bem próxima de nós, finalmente conseguiu realizar o sonho de pintar sua casa. Foram meses, mais de ano juntando suas economias para dar de presente à sua família uma casa mais bonita e um lugar mais aconchegante. Coincidência ou não, os trabalhos foram concluídos justamente na sexta-feira e ele, o cidadão anônimo quis comemorar em alto estilo. Convidou irmãos, irmãs, cunhados, cunhadas e sobrinhos para um grande churrasco, que se estendeu até quase meia noite. Foi um dia de muita felicidade para ele e toda sua família.

Terminada a festa, guardou tudo e fez a limpeza para, no dia seguinte cuidar do jardim em frente à casa. Após a faxina e o banho, quase uma e meia da manhã ele se deitou. Às sete e meia levantou-se, tomou café, pegou todos os materiais e foi ao jardim para fazer os reparos necessários. Ao chegar, quis dar mais uma olhada para ver como estava a pintura. Atravessou a rua e foi até a outra calçada. Ao virar-se, a surpresa... Em letras garrafais estava escrito: “PIXEI”. A revolta do cidadão foi tanta que se, naquele momento ele pegasse o autor da façanha faria uma loucura.

Por alguns instantes ele ficou sem fôlego. Abaixou a cabeça. Ensaiou um choro, mas respirou fundo e controlou-se. Sentou-se na sarjeta, colocou a cabeça entre os joelhos e ficou alguns minutos perdido, desolado, sem saber o que fazer. Em seguida foi até o jardim, já sem nenhuma vontade de trabalhar, mas insistiu e com muita relutância fez o que havia planejado. O trabalho ficou muito bonito, mas uma angústia e um sentimento de raiva; dominava o cidadão anônimo. Para ele, toda a alegria da festa e da pintura havia terminado. Sentia dores na alma. Foi um sábado extremamente cinzento.

No domingo, ele chamou um dos pintores e com muito cuidado e capricho raspou o local pichado e passou a tinta que havia sobrado. Felizmente, ele conseguiu recuperar o trabalho, mas a alegria já não era mais como foi logo após o término dos trabalhos. Dos males, o menor. Tudo estava bonito novamente. Na segunda-feira, às seis horas da manhã, ao sair para o trabalho, novamente ele se deparou com a mesma surpresa... Também com letras enormes. Agora a frase era outra: “PIXEI DE NOVO”. Foi até o DP mais próximo e registrou um Boletim de Ocorrência que de nada adiantou.

No final do dia, saiu mais cedo do trabalho, chamou o pintor e com o mesmo cuidado fez o reparo tudo de novo. Dessa vez ele queria pegar o autor da “brincadeira”. O jeito foi permanecer acordado a noite toda, mas o “artista” não apareceu. Foram três noites sem dormir, na tentativa de pegar o vagabundo, que não apareceu. No sábado de manhã, ao sair p/ comprar pão e leite, a surpresa estava estampada no muro novamente. Desta vez, a mensagem foi mais provocativa ainda: “SE PINTAR EU PIXO OUTRA VEZ .”

A fúria contra o autor das pichações só não foi maior porque, mesmo depois do segundo Boletim de Ocorrência, nenhuma medida concreta foi tomada. Pior que isso foi ter que ouvir as brincadeiras de amigos e vizinhos que, em vez de ajudarem na captura do desocupado, riram da coragem, do atrevimento e da “criatividade” do bandido.

fiore carlos
Enviado por fiore carlos em 28/12/2008
Reeditado em 28/12/2008
Código do texto: T1355834
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.