O ACASO DOS CASOS

É espantoso como as coisas acontecem, no nosso dia-a-dia. Ou como não acontecem. Ou como iam acontecer, e terminam saindo totalmente o oposto do que esperávamos. Desde o simples fato de ligarmos para um amigo, como a mais nobre intenção, e recebermos um esculacho, em vez de um bom dia. Ou irmos trabalhar e vermos, o pára-brisa do nosso carro, ser arrebentado por uma pedra, arremessada por um moleque sacana. Ou ainda, sermos despedidos pelo telefone. Ou até mesmo um dramático episódio de um bombardeio, duma pomba maliciosa, armada com uma granada anal. Sem falar nas coisas fisiológicas, que podem nos ocorrer, como aquela chata emissão de gases impróprios. As chamadas flatulências. Que saem sem permissão. Ou ainda ter um encontro marcado com aquela pessoa especial, que levamos três meses, duas semanas e quinze dias. A chateando e nos humilhando. E ganharmos, no fim do drama, um "bolo". Mas também há coincidências boas, como a do tipo: ser cantado por uma vizinha gostosa, ou ser promovido na empresa, depois de dez anos de humilhação, ou ainda achar um trevo de quatro folhas, enganchado nas brabas do gato de estimação, do cunhado gay, que vive ao telefone, ocupando a linha, ligando para o disk amizade. E, no fim do mês, não dá um centavo, para pagar à conta. Porém, essas coisas, acontecem tão freqüentemente quanto um deputado cumprir as promessas de tempo de eleição. A tudo isso se dá o nome, acaso. Cinco letrinhas que nos levam ao Éden ou ao reino das lamentações. Ou, além disso, na maioria dos casos, suicídio ou falência.

Temos de ter em mente sempre uma frase "nada é para sempre". Aliás, é o tema dum filme cheio de acasos. Mas, como a própria frase diz nas suas entrelinhas, não há eternidade. Se a coisa está ruim, pode chegar ao ponto de você querer ser jogar na frente de caminhão, ou tentar lutar pelado, com um jacaré. Todavia, também os acontecimentos podem sair tão perfeitamente bem, que, no fim, não conseguiremos acreditar neles, nem no que nos proporcionaram ou proporcionar-nos-ão. Como, receber uma ligação inesperada, de uma pessoa mais inesperada ainda, e após cinco minutos de conversa, achar que o mundo é cor-de-rosa. Que os pássaros não estão cantando e, sim, recitando poemas de amor, de pura excitação e sinceridade, em sua homenagem. Ou até sentir a pele do ser amado, apenas fechando os olhos. E lembrar, da maciez dos seus lábios, comendo caju ou encostando os mesmos no espelho.

Contudo, a única verdade suprema, é que, não há sorte ou má-sorte, existe apenas o acaso. Existem coincidências. Há um jogo misterioso ao despertarmos. No entanto, Deus não nos dá as regras. Os olhos nem sempre vêem tudo. Nem tudo é para se ver, ou se pode ver. Somos o que aconteceu e o que o acaso permitiu, ou não pôde conter. Porque, mesmo para o acaso, há acasos, que o controlam. Que se divertem com ele, como ele, conosco. Não somos o fim nem o começo, somos para o acaso, um caso mal resolvido, do acaso com ele mesmo. A perfeição imperfeita.

Em suma, acho que amanhã irei tomar um sorvete. Ou irei à praia. Ou comprarei aquele violão novo. Ou ligarei para o meu amor antigo. Ou irei ao urologista. Ou venderei a minha sogra. Ou escreverei um livro. Não sei. Acho que o acaso começou a brincar de novo com o meu destino. Será que foi por acaso?

Emanoel Rodrigues
Enviado por Emanoel Rodrigues em 28/12/2008
Reeditado em 28/12/2008
Código do texto: T1356384
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