Não, não está tudo bem

A solidão chegou.

Como eu me sinto sozinho. Abandonado. Sinto-me mal e sei que a causa é a solidão.

Eu tento disfarçar. Fico rindo sem motivo. Falo sem querer falar.

No fundo, as pessoas sabem que por dentro sofro, então tem sempre um idiota que pergunta se estou bem.

Se quer me matar, pergunte se está tudo bem.

Não porra, não está nada bem.

Quando se está sozinho e triste, as coisas não andam bem.

Solidão tem um pouco de saudade. Saudade dos fatos que nunca se repetem, talvez.

Quando você lembra de algo, tem a certeza que fez algo errado e nada mais pode mudar, não, as coisas não estão bem.

Se quer me matar, pergunte se está tudo bem.

Eu não tenho mais nada a fazer. Eu fico olhando para o monitor e só. Eu só fico olhando o monitor.

Nada mais tem graça. Não há encanto nem prazer.

Acho que cheguei ao estágio pleno da miséria humana. Quando você olha para os lados, para frente e para trás e não encontra significados, desejos ou alegria, é porque as coisas não estão nada bem.

Se quer me matar, pergunte se está tudo bem.

Eu escrevo por escrever, só para dar o último suspiro de significação às coisas.

Então eu escrevo pra nada. Não vai mudar nada.

Eu tinha algo bom na minha mão, mas foi embora e não irá retornar.

Eu poderia começar do zero. Fazer de novo. Levantar e seguir em frente. Mas eu tenho preguiça, não tenho vontade, prefiro ficar deitado mesmo.

Eu olho para cima e digo: “Deus, me trás um copo de água.”.

Quando você estiver deitado numa cama, emagrecer 16 kilos e dormir 18 horas por dia devido à overdose não mortal de calmantes, NÂO, definitivamente você não está bem.

Se quer me matar, pergunte se está tudo bem.

Não, aqui não anda muito bem.

Se no natal e ano novo você estiver sozinho e por algum motivo seu psiquiatra está fazendo plantão – longe de mim dizer que ele está lá para socorrer algum paciente suicida que tem a assinatura dele no prontuário -, algo não anda bem.

Se me perguntam por que são tão neurótico e paranóico, digo que Wood Allen também é, logo, as pessoas logo me vêem com bom olhos.

O charme está na doença: não entendi até agora.

Depressão virou a maior justificativa para a frustração.

Eu poderia pensar bastante sobre essa relação doenças psíquicas e moda, mas estou estagnado.

Quando sua mãe e seu pai vêem você tendo uma crise de pânico, é bem diferente daquela “crise de pânico” que seus pais viram quando seu hamster morreu e você chorou.

Claro que alguém irá pensar: “Não substime as pessoas, elas podem ser loucas”. Seria um grande alívio saber que há pessoas que se refugiam em suas doenças para justificar seus medos.

Antes até que era legal chamar a atenção, mas quando não há pessoas para serem atenciosas com você, não há mais motivos para frescura.

Mas de repente meus problemas se tornaram reais.

Talvez de tanto acreditar que tenho problemas, acabei virando um problema.

Mas quando tiram uma foto de mim, insistem para que eu sorria. Eu mostro os dentes e todos param para saber se estou bem.

Se quer me matar, pergunte se está tudo bem.

Não, as coisas continuam não indo bem, pelo menos para mim.

Por ironia do destino, eu trabalho na assistência social da prefeitura de São Paulo.

Por coincidência absurda do destino, eu trabalho no distrito que tem o maior número de suicídio.

Por porra do caralho da merda do destino, eu cuido da supervisão do CVV da região. Eu tenho, indiretamente, que convencer as pessoas a não se matarem.

Eu não sei exatamente quem é Deus, mas ele ta está assinando o contrato sem ler.

Quando uma pessoa do CVV me fala que conseguimos diminuir o número de suicídios por causa da minha campanha de reinserção social através do vínculo da pessoa com sua comunidade local, eu fico imaginando quem deve ser o piloto do avião.

Mesmo assim eles confiam em mim, e eu confio no meu salário.

Se alguém me diz: “como é salvar vidas?”, “Como é saber que seu trabalho está salvando vidas?”, “Você é um boa pessoa nesse mundo, veio a pedido de Deus”. Eu fico pensando se minhas cortinas azuis vão combinar com meu sofá preto; se teria como eu receber minha mesa de mármore o mais rápido possível, pois estou aflito.

Eu pergunto:

- Vocês estão bem?

Plínio Platus
Enviado por Plínio Platus em 02/01/2009
Reeditado em 18/01/2009
Código do texto: T1363240