A princesa e o fogão a lenha

Meu pai, José Vilela da Fonseca, sempre usou palavras carinhosas e agradecidas quando se referia à minha mãe. Em suas internações hospitalares, já em idade avançada, ele chegava a chorar com saudades da Mercês, a sua eterna princesa! Acatava, de bom grado, a todos os seus pedidos e sugestões.

Lembro, na ocasião em que mudamos para a roça, quando, sentada num rústico banquinho, acompanhei interessada, passo a passo, a feitura do fogão a lenha.

Meu pai caprichava nos detalhes, porque sabia da importância que minha mãe dava a um fogão a lenha. Desde menina ela aprendeu a arte de nele trabalhar, tornando-se exímia na ciência de acender um fogo. Tem a hora certa de colocar os paus mais grossos, os mais finos, os gravetos, as cascas secas de laranja e algum papel, se necessário. E para manter aceso esse fogo também se precisa de maestria porque as achas, além do tamanho ideal, precisam obedecer a um rústico, mas verdadeiro layout!

Cozinhar neste fogão exige sabedoria. É fazer o almoço e, logo a seguir, aproveitar as brasas para assar bolos, pudins, bananas, batatas-doces... Hum!... Só de lembrar me dá água na boca!

O fogão tem o forno como complemento e a serpentina que leva a água quentinha até a torneira da pia da cozinha e ao cômodo de banho, proporcionando-nos uma gostosa chuveirada.

Nossa família sempre teve uma saudável convivência, com bons papos ao redor destes fogões. Rolam lembranças que todos querem resgatar, seguidas de risos e enleios. Na cozinha servem-se o almoço, o café da tarde e a indispensável janta. Para nós sempre foi o lugar mais importante da casa. Hoje a cozinha ficou pequena para abrigar todos os filhos e filhas, noras e genros, netos e netas, bisnetos e bisnetas, sobrinhos e sobrinhas, todos os demais parentes e amigos.

Mamãe procurou passar para todos nós esta arte de lidar no fogão a lenha, que domina nos mínimos detalhes e com tal arte alimentou prazerosamente todos os seus onze filhos: Luzia, Lúcia, Divino, Maria Elena, Maria Célia, Edwirges, Fernando, José Libério, Bonifácio, Tarcísio e Inácio. E que mão boa para temperar! É água na boca e saudade no coração!

Publicada no Jornal Agora de 20 de junho de 2010.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 10/04/2006
Reeditado em 17/07/2010
Código do texto: T137007
Classificação de conteúdo: seguro