Amigo Caipira II

A nóis ai trá veis sinhô prisidente, Fernando Henrique C. Cardoso. . . Dessa veis é com tristeza e pesar qui iscrevo pra vosmicê. Nóis já tava inté acustumado com aquele título de meados de 1996, o sinhô se alembra num é mesmo? Vosmicê chamou todo o povo de “caipira”. Oia foi um título pra caipira ninhum botá defeito. Mas agora, vosmicê como o número um dessa caipirada boa, pisou na bola (mais uma veis), pisou feio. Nóis além de caipira ganhamos outro título, mais nóis num gostou nem um tiquinho. O sinhô bem qui pudia tê chamado à gente de “desempregado, sem serviço, atoa”, mais de “vagabundos”? Doeu um bocado, doeu pra cachorro.

Confesso qui sê chamado de caipira é inté gostoso, identifica mais com todos nóis, num é mesmo, sinhô prisidente, Mais, vagabundo. . . Isso faiz com qui nóis fiqui muito intristecido. Dispois de trabaiá quase trinta anos, será qui nóis não contribuímos o suficiente para o crescimento dessa grande “Nação” de caipiras?

Oia sinhô prisidente, esse caipira seu amigo, seu irmão, qué continuá a trabaiá, sim sinhô, mais é tão difícil encontra argum trabaio, principalmente pra ganha um salário digno, justo, compatível com a experiência (de vagabundo) já adquirida, Mais o sinhô como bão prisidente (caipira) qui é, bem qui pudia arranja uma vaguinha aí, prêsse seu amigo caipira. Num quiria muito não, pudia sê assistente de carquer coisa, carquer Ministério tava de bão tamanho prêsse seu amigo caipira, que simpatiza tanto com vosmicê. (simpatiza é com “s” ou com “z”) deixa pra lá.

Sinhô prisidente, meu amigo, meu irmão camarada, batuta dos bão, sabe o qui vosmicê aprontou dessa veis? Oia, a caipirada aqui imbaixo ficou uma arara (ficou braba mesmo), pur sê chamada, classificada e rotulada como “vagabundos da aposentadoria”. Meu amigo, a coisa ta feia, tão inté priguntano se vosmicê ta se oiano no ispeio. Uns mais afoitos tão priguntano se o meu amigo prisidente num fica velmeio feito índio, pintado pra guerra.

Oia, o sinhô é batuta mesmo, nóis tamém tão ficano batuta uai, como bão caipira, bão aluno, purque temos um “professor” muito batuta, qui ta insinano pra nóis muita coisa das boas. Como nóis tão ficano intindido, tamo analisano o que é sê “vagabundo” pur ganhá um salarinho tão irrisório, inquanto vosmicê, meu amigo, meu irmão, istá acobertado pur umas duas ou treis aposentadorias qui nóis num sabe nem mesmo como calcula, de tão gorda qui ela é (ou qui elas são), num faiz mal não, deixa pra lá.

Mais a vida é assim mesmo. Inquanto a caipirada aqui de baixo (aliás, os vagabundos) come o pão qui o diabo amassou. . .

Ah! Apruveitano o insejo, qui aumentaço o sinhô liberou pra nóis (os caipiras da aposentadoria). Virge-mãe, o aumento foi tão grande, qui os impostos cumero tudo e muito mais. Deiz reaiz de aumento pra caipirada, só Jesus pode nos ajudar. Ta bão, bão dimais pra vosmicê, bão dimais pra nóis tamém, gostamos de sofrê, uai!

Dispois de caipiras, deiz reaiz de aumento e agora vagabundos. . . É muito pra nossa beleza. Oi, disculpe, istou me sintino cansado com tamanha amargura. Já istá um pouco tarde, é madrugada, vou ficano pur aqui, dispidino do meu amigo e irmão prisidente, desejano-lhe boa noite (se é qui sua consciência vá permitir).

Penso qui mesmo vagabundo, tenho direito a um discanso. Deixo agora os meus rabiscos para nova oportunidade, pois, acridito qui a terei. Vosmicê num vai decepcionar, num é mesmo?

Agora vou recolher-me e recostar a minha tão cansada massa cinzenta no meu pequeno travesseiro, vou sonhar, purque o sonho ainda é a única coisa qui resta a esse caipira e vagabundo, a única coisa boa e qui não se paga imposto (ainda) e nem se pode tirar.

Meu amigo, meu irmão prisidente, com toda certeza eu terei sonhos, sonhos bons, vosmicê pesadelos. Purque o meu sonho e de tantos otros caipiras e vagabundos, são sonhos de democracia e liberdade.

Inté outro dia, um abraço desse seu amigo e irmão, caipira e vagabundo.

19/05/98.

Wilcaro Pastor
Enviado por Wilcaro Pastor em 16/04/2006
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