FIM DE FÉRIAS

O sujeito tinha todas as virtudes natas de um político, nenhuma adquirida. Um analfabeto funcional que nunca leu jornal na vida, embora olhasse eventualmente as fotos.

Há quase uma década eu não tirava férias. Pensei, este janeiro será só vadiagem, nem trabalho, nem Recanto, nada que lembre a rotina dos últimos anos. Uma ilusão.

Entre o final do mandato de prefeito numa cidade do interior distante quase quatrocentos quilômetros de Porto Alegre, foram oito movimentados anos desta vez, e a retomada no cargo de auditor federal na capital havia uma mudança, apartamento, documentos para viabilizar negociações, reformas, idas e vindas, enfim, lá se foi janeiro. E nem passei na praia.

O certo é que terça feira, aqui segunda é feriado, termina a mamata e isso me fez lembrar o sujeito que citei. Por sorte, estava ele no lugar certo na hora certa, foi adotado por um líder comunitário que transformou o Lilica num vereador. No início, era apenas um grosso desembaraçado, um “sem noção” experto, se isto é possível.

No grito aqui, aos trancos e barrancos ali, foi se mantendo, de forma que se reelegeu e se elegeu de novo. Há muito no cargo, preencheu o formulário da Justiça Eleitoral, profissão: vereador.

Antes de tudo, cuidava dos seus. Primeiro a família, era um de seus lemas, o que significava pedir emprego para a mulher, filho, irmão, tio, sobrinho, e também pedia para alguns mais necessitados, atendidos primeiro os seus, claro.

O povo gosta de quem trabalha, e eu trabalho, dizia. Nos eventos comunitários estava sempre, de preferência, cantando o Bingo, questão de visibilidade.

Homem de fazer, segundo o próprio, e de muito falar, se mantinha no cargo criticando os adversários e os companheiros. Era sua prática mais segura, mantinha um eleitorado cativo de quem era a voz.

O problema é que de tanto falar que os outros não valiam nada, acabou acreditando que valia muito e se lançou numa empreitada maior, quis ser prefeito.

O que tinha tudo para dar errado, deu.

O que deixou o Lilica mais injuriado foi ter perdido por pouco. Botou a culpa em todos os infiéis e em todos os incompetentes que o rodeavam.

Dizia: não tem problema, tenho meus braços. O repórter que o entrevistava, insistiu:

- Agora, o que o senhor vai fazer?

Ele, sem nenhum constrangimento, respondeu com a frase que fez com que o lembrasse esta semana.

- Agora... e fez uma pausa, como quem raciocina,... agora, eu vou ter que trabalhar!