Crônicas da Amendoeira ( Prêt-À=Porter )

Prêt-à-Porter não costuma frequentar os encontros de poetas da Amendoeira. Não conheço a razão de tal ausência, especialmente quando todos sabem que o afetuoso amigo tem uma quedinha especial pelos versos de Augusto dos Anjos. Lembro-me. inclusive, que em discussões filosófico-religiosas, travadas em atmosfera de fumaça e vapor etílico, ele nunca se esquecia de declarar=se um filho do carbono e do amoníaco. Gostava do cosmopolitismo das moneras, embora esse reino da natureza lhe fosse tão desconhecido como a cabeça de um bacalhau. Mas, em sua opinião, o poeta de Pau D'Arco era mais um dos poetas injustiçados por editores, professores de literatura, críticos de literatura e pelos que assim se julgam. Talvez, com algum exagero, para o dileto amigo, o poeta de sua predileção era um desconhecido do brasileiro, uma espécie de Piauí nas confissões de Nélson Rodrigues. E quando alguém, com o fito de lhe agradar, fazia um afago de cão no poeta, o velho rosnava com seus botões:

- A mão que afaga é a mesma que apedreja!

Eu ria nessas horas. Mas eu ria de alguns poetas de alfazema que colhiam em seus ouvidos aqueles versos com caras de quem põe na boca um pedaço de carne putrefata.

No entanto, hoje, num desses escontros, depois de me empaturrar de amor e dor, luar e mar, mas não beijos e peidos, entreguei os pontos. Recitei Versos Íntimos, e cheguei a sentir o beijo agradecido do velho guardador de águas da Cedae, mas sem nenhum gosto de escarro. Fu satisfeito para casa. E na distância que separa o bar de meu aconchego, ri uma última vez naquela noite. Imaginei um Prêt-à-Porter na ponte Buarque de Macedo indo em direção à Casa dos Agras.

- Aleluia, Prêt! - falei baixinho comigo mesmo.

Aldo Guerra
Enviado por Aldo Guerra em 14/02/2009
Reeditado em 14/02/2009
Código do texto: T1439020