A tristeza necessária

Mas, pra fazer um samba com beleza/ É preciso um bocado de tristeza/ É preciso um bocado de tristeza./ Senão não se faz um samba não. Baden Powell e Vinícius de Moraes, em Samba da Bênção

Juventude e alegria, aliados a um sem número de bens materiais e festas onde só há gente bonita, sorrindo com seus dentes perfeitos. Se palenteólogos do futuro toparem apenas com a filmes publicitários, será essa a dedução sobre nossa época. Se forem mais fundo, bem aí a coisa mudará, pois virá à tona a hipocrisia por trás de tanta alegria falsa e superficial.

Estamos esquecendo a tristeza: vamos da alegria fútil à depressão, sem qualquer estágio intermediário. Recheados de falsidade na alegria, preocupados com o irreal na depressão. Mas, no meio, há uma saudável tristeza, necessária não apenas para o crescimento, mas para a sobrevivência.

Precisamos da tristeza assim como da palavra, como da esperança e da euforia. Precisamos da tristeza porque precisamos de equilíbrio.

Em uma novela antiga (quem diria?) uma moça diz a um poeta: “Poeta não nasceu para ser feliz, mas para fazer os outros felizes”. Exageros e simplicismos à parte, o samba de Vinícius e Baden-Powell diz a mesma coisa, com mais profundidade. Alguém já imaginou a literatura sem tristeza? A música? Não dizemos que um filme é bom por termos nos esbaldado de chorar ao assisti-lo? Não ouvimos centenas de vezes a mesma canção que toca nossa alma e torce nosso coração? Não admiramos o poema esculpido com a dor da saudade?

É possível não reconhecer a incomensurável beleza da “Pietá”, de Michelangelo, resumindo, talvez as dores de todas as mães do mundo?

A tristeza tem uma sabedoria que nenhum outro sentimento tem: já nasce introspectiva, já nasce poema e lição. Cobre-nos com seu manto cinza, mas dá-nos sempre a perspectiva do brilho da aurora, mesmo que nada mais reste. Fugir dela é inútil, ela nos acha, mesmo quando escondidos atrás de risos e gargalhadas, e nos chama à razão.

Não deve ser nossa companheira de todas as horas, não, porque ela também é sem-vergonha, mas estar aí, visitar-nos uma ou outra vez não faz mal não. Se vier com cheiro de nostalgia e gosto de doce dor, melhor.