NA CURVA DO RIO PARAÍBA...

Encontrei-me com um velho conhecido, por acaso, no Aeroporto Bartolomeu Lisandro. Ele esperava por alguém que iria chegar, enquanto eu aguardava para viajar ao Rio de Janeiro. Conversa vai, conversa vem, disse-me que estava reencontrando um monte de gente, que já não via há algum tempo. Aí, eu fiz uma brincadeira:

— Deve ser porque está todo mundo viajando de avião e você, só de ônibus.

— Isto é verdade! Concordou o meu conhecido, levando a sério o que eu dissera. Eu não me entusiasmo muito mesmo pelas viagens aéreas. Porque tenho uma lembrança ruim, com esse negócio de voar.

Imaginei logo que se tratasse de algum grande susto, num voo desses cheios de turbulência ou a perda de alguém muito próximo, num acidente aéreo. E fiquei pensando no que poderia ter sido, sem a coragem de perguntar, para não cometer a inconveniência de fazê-lo falar de reminiscências que, pelo visto, deveriam ser desagradáveis.

Foi quando, por iniciativa própria, começou a me explicar do que se tratava:

— Tenho uma prima que foi noiva de um piloto da FAB. E certa vez, ele apareceu por aqui, pilotando um daqueles AT-33 e ficou conosco um dia ou dois. Primeiro, convidou a noiva para dar um passeio e andou “aprontando” e fazendo umas piruetas com ela a bordo. Mas sei que “pegou mais leve”...

Depois me chamou para dar uma volta também. Decolou e começou fazendo um voo rasante sobre a pista. Em seguida fez uma série de manobras radicais, como tubos, “loopings” e parafusos. Senti muita náusea, mas não disse nada, porque eu já havia me prevenido, inclusive, com um desses saquinhos plásticos, para enjoo.

Aí notando que eu estava um pouco pálido e suando frio, achou que era melhor “aliviar a barra” e disse:

— Vamos dar uma chegada até a praia, para você ver como é bonito aqui de cima. E virou a proa na direção da desembocadura do rio, seguindo o curso do Paraíba. Mesmo assim, foi fazendo um voo rasante, até que, quando nos aproximamos do mar, ele “arremeteu” subitamente o avião e fez uma curva fechada à esquerda.

Nessa hora, eu não aguentei mais o enjoo e, literalmente, “enchi o saco”! Voltamos a Campos e quando pousamos, lá numa ponta da pista, ele abriu a carlinga e me disse que eu jogasse o saco de plástico fora:

— Pode deixar a sua carga aí mesmo.

Foi embora e, nove dias depois — apenas nove dias depois — ele morreu num acidente aéreo. Aliás, o avião desapareceu, com piloto e tudo, no meio de uma tempestade. Nunca acharam nem vestígio dele ou da aeronave.

O meu conhecido terminou a narrativa e ficou me olhando, com aquele jeito de quem pergunta: “entendeu, agora, o motivo pelo qual eu não gosto de avião?” Mas, para ser sincero, eu não havia entendido direito. Não ficou muito claro para mim se o trauma provinha da morte prematura, em acidente aéreo, desse quase primo ou se do excesso de adrenalina que fora obrigado a experimentar, por causa de um jovem e imprudente piloto.

Em qualquer dos casos, acho que é motivo bastante para se perder o gosto pelas viagens aéreas. Mas fiquei lamentando que tenha sido eu, e não o romancista Paulo Coelho, o ouvinte privilegiado desta narrativa incomum.

Porque se fosse ele, do jeito que sabe explorar um enredo e com a intuição de que é dotado para o que pode ser um sucesso editorial, o autor de “Na curva do Rio Piedra, eu sentei e chorei”, em breve estaria com outro livro no prelo: “Na curva do Rio Paraíba, eu enjoei e vomitei”!

Seria um novo “best seller”... Com toda certeza, seria!