LEMBRANÇAS DE CARNAVAL

Este humilde espaço semanal é lido, entre outros, pelo casal Regina Célia Palomares e Alceu Romano; por Benedito Antonio Thomas, o sempre bem humorado “Bepe” dos tempos de ginásio; Antonio Oswaldo Zampieri, competente contabilista. Todos assumidamente saudosistas que se lembram, muito bem, dos carnavais das décadas de cinqüenta, sessenta e início dos anos setenta, antes da chegada das transformações que alteraram radicalmente os usos e costumes, assim como as antigas tradições dedicadas a Momo.

Os anos sessenta foram os que mais lembranças deixaram em muitas gerações. A minha, principalmente. Afinal, estávamos descobrindo os muitos mistérios da vida, ultrapassando fronteiras apenas adivinhadas e o carnaval representava justamente isso, uma liberdade bem maior, sem a vigilância severa de pais, parentes, amigos e outros observadores que adoravam colocar a colher no mingau alheio. Apesar dos tradicionalismos ainda vigentes e da alta frequência das famílias aos festejos, já eram possíveis os chamados romances de carnaval, com duração prevista de apenas quatro dias, para tudo terminar na quarta- feira. Mal comparado, seria o “ficar” dos dias atuais. Talvez, por isso mesmo, o compositor tenha escrito com muita propriedade “confete, pedacinho colorido de saudade...”

O leitor Orisvaldo Ormeleze, o popular Piola, hoje empresário de sucesso relembrou, outro dia, num encontro casual, que naqueles anos sessenta muitos jovens, como ele, que trabalhavam bastante, ganhavam pouco e sonhavam participar dos bailes do Aero Clube que, na época, possuia um grande número de associados, com severa vigilância na portaria. Por isso, aplicavam um truque. Iam ao Grêmio Paulista, agremiação da qual faziam parte, brincavam bastante, ficavam transpirados, cheios de confete. Depois, saíam correndo para a porta do outro clube, misturando-se à multidão. Pediam aos responsáveis pela porta para sair, tomar um ar. O porteiro, preocupado com a aglomeração, informava que ninguém sairia até todos entrarem. Em poucos minutos estavam lá dentro, sem maiores problemas.

Todos os coroas de hoje relembram alguma coisa daquela época, quando os cabelos eram pretos, a disposição muito grande e o bolso relativamente vazio. Por isso, era preciso economizar. O luxo máximo permitido era consumir uma ou duas Cuba Libres ao longo da noite, o que deixava o pessoal com a cabeça mais ou menos em ordem, exatamente para saber o que estava fazendo, não falar bobagens e escolher as palavras exatas para ganhar as colombinas. E era aí que começavam os flertes. O termo era esse mesmo. A paquera ganhou força no início dos anos setenta, com a chegada de muitas outras liberdades.

Depois, era só ficar na frente da grande roda que se formava no centro do salão, observando as meninas. As acompanhadas, sempre escoltadas pelos respectivos e vigilantes parceiros e, principalmente, as solitárias. A troca de olhares era intensa. Às vezes bastavam alguns sorrisos e, não raras vezes, a mão estendida numa espécie de convite. O par estava formado. Para uma ou todas as noites e, em alguns casos, para toda a vida.

Naqueles ainda severos anos sessenta, muitos pais não permitiam que suas filhas participassem dos bailes. Mesmo as já comprometidas. Assim, os namorados davam uma escapadinha, apenas para olhar. Vários namoros terminaram aí, exatamente em virtude desses pequenos escorregões. Afinal, a festa contagiava e ninguém era de ferro. Para muitos, tenho certeza, essas imagens permanecem vivas. Afinal, são somente “as lembranças de carnaval...”