Desgraça unilateral

Talvez em alguns momentos haja graça em ser engraçada. Quando todos os espelhos estão virados para a parede, por exemplo. O riso, nas situações cômicas, acontece como extravasamento da tensão. Em sua maioria as situações cômicas são trágicas. Ainda que não o sejam, para fazer alguém rir é preciso descer do orgulho e enxergar o próprio ridículo. Sem espelho fica mais fácil, pois não tenho de encarar a perda da compostura, os trejeitos de olhos e bocas, o corpo desengonçado, os esgares, o chacoalhar descompassado. Entendo porque rio de olhos fechados: para aumentar o cômico e diminuir o trágico. Deixo por conta da imaginação. Imagino que quem está rindo comigo também está com os olhos semicerrados, muitas vezes embaçados pelas lágrimas. Dizem que tudo está bem quando ainda podemos rir de nós mesmos... Nada a temer então, não é mesmo?

Quando terei descoberto que gosto de fazer rir, não sei. Creio que foi mesmo por sentir uma pontinha de admiração por quem não precisa sentir-se perfeito; pelas pessoas desse tipo que eu conheci. Essa admiração foi crescendo e à medida que fui me desestruturando e sentindo menos formal, fui percebendo meus modos de ser, falar e movimentar-me menos harmônicos. A arte relaciona-se à harmonia; o desastre à desarmonia... Pode ser também a lembrança do meu Charles (pai) Chaplin... Com seu bigodinho e seu modo teatral de brincar conosco, as mágicas, as moedas tiradas do meio dos dedos, de trás da orelha, os truques do chapéu.

É claro que fiquei surpresa quando descobri que os outros podiam rir de minhas palhaçadas, intencionais ou não; com certeza, mais das não intencionais, a princípio, porque serão sempre as melhores... O ridículo espontâneo! Talvez tenha eu mesma começado a achar graça nisso, não sei, para chorar menos... Com o tempo, vou notando que as pessoas sempre riem comigo; de uma forma ou de outra; quando não acham em mim nenhuma graça, talvez riam em silêncio de eu estar rindo sozinha. O que sei é que para minha desgraça, a minha graça aumenta.... E, acredito, chegará ao seu auge, quando me nascer uma verruga na ponta do nariz...