SE A PALAVRA É MINHA...

A falta de compromisso com suas próprias declarações, promessas e posturas, assumidas em determinados momentos — não raras vezes, na semana ou no dia anterior — parece ser o grande mal que vem assolando os políticos e as autoridades, nos dias que vivemos neste desditoso país.

Já nem falo de um presidente que, ao assumir o poder, joga na cesta de lixo todos os seus escritos, os seus discursos de campanha e as suas promessas, renegando o seu passado e pedindo, aos que lhe cobram coerência e um mínimo de decência, que esqueçam a sua obra e o seu discurso anterior, como o Fernando Henrique Cardoso. Nem de outro, como o Lula, que se elegeu como representante do proletariado, mas vive como burguês. Que faz um discurso para a plebe que não sabe de nada e, logo em seguida, articula com as elites, que sabem de tudo. Porque aí, também, a prática já atinge a um nível de caradurismo que os eleitores não se mostram aptos a enfrentar e que exige a intervenção urgente de um terapeuta altamente qualificado.

Refiro-me ao cinismo do dia a dia, que a população, estarrecida, mas impotente, assiste, ouve e lê pela mídia, quando políticos e outras autoridades, alguns da maior expressão — como ministros, governadores, prefeitos municipais, parlamentares e membros do Judiciário ou do Ministério Público — justificam ou tentam desviar a atenção de fatos e situações, os mais embaraçosos, com desculpas e argumentos que são, por si mesmos, uma absoluta falta de respeito ao cidadão-contribuinte.

Tornou-se comum que essas personalidades adotem uma posição clara num dia, acerca de algum acontecimento ou evento que perturbe a sociedade e mobilize a opinião pública e que, no dia imediato, estejam diante das câmeras e microfones da imprensa, dizendo o contrário, justificando o contrário e, invariavelmente, se eximindo de qualquer responsabilidade quanto ao problema. A questão da crise financeira que assusta, em todo o mundo, empresários e trabalhadores, serve bem de exemplo a isto.

Vivemos sob o império do cinismo, que parece ser a marca deste começo de século no Brasil. Ao que tudo indica a maioria dos políticos e autoridades não se sente obrigada a respeitar a inteligência ou o voto do cidadão. Tanto quanto não parece sentir-se no dever de prestar contas da forma como usa e, às vezes, some com o dinheiro do contribuinte.

Descobre-se um trambique, num alto escalão do governo e logo vem aquele, a quem cabe a responsabilidade final e maior pelo problema, com ares de indignação, com jeito de marido enganado, a protestar através da mídia: “É preciso apurar os fatos e punir com rigor os culpados!”.

Só pode ser deboche, até porque, no final de cada pequeno ou grande escândalo, nem os fatos são esclarecidos como devem, nem os verdadeiros culpados são punidos como merecem. E o Brasil está repleto desses lamentáveis exemplos.

Essa falta de compromisso com a verdade, com a decência e com a coerência, entre a palavra empenhada e a conduta posterior — que nos dias atuais é o traço marcante da maioria dos homens públicos — só me lembra uma pessoa que conheci, há muitos anos atrás. Era pai de quatro filhos e, frequentemente, para livrar-se da insistência no pedido de algum deles, prometia fazer ou comprar alguma coisa que o “pentelho” estava querendo.

Mas como consentia no pedido, apenas para livrar-se da maçada daquela ocasião, é óbvio que depois deixava o assunto cair no esquecimento, até que um dia era cobrado pela promessa. E quando dizia ao pretenso credor que não faria nada daquilo, que não concordava ou coisa que o valha, invariavelmente, ouvia o argumento:

— Mas pai, você deu sua palavra!

Era então que, sem tremer um único músculo do rosto, respondia, pondo fim à discussão:

— Se a palavra é minha, eu dou e tomo quando quiser!

Esse meu sogro não era fácil! Mas pelo que se vê, era um homem bem adiante do seu tempo...