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 Almanaques
 
         “A palavra almanaque ou Almanach do árabe al-mana_kh). Segundo o historiador Stephanos Demetriou Stephanou Neto, al- manakh (literalmente “lugar em que o camelo se ajoelha”) era o ponto de reunião dos beduínos para conversar e trocar informações sobre o dia- a- dia. Essa palavra adquiriu, no Brasil, o significado de uma obra impressa de conteúdo científico, literário e humanístico. O primeiro e, provavelmente, mais duradouro dos almanaques brasileiros foi o Laemmert, publicado entre 1843 e 1937...”(da Wikipédia..)

      “Desde menina sou traça”, é um verso que começo um dos meus poemas, metáfora assumida da minha compulsão por ler, “traçar”, devorar tudo que parecia/era livro. Desde que descobri o mundo da leitura nenhum impresso passou incólume aos meus olhos. Todos foram devidamente lidos, fuçados, embora nem sempre devidamente compreendidos.
        No raiar da infância, minha mãe pedia minha ajuda nas tarefas de casa: “Filha, passe a vassoura na casa!” Ou ainda: “Filha, arrume sua cama!” E eu fazia o que me pedia, mas se encontrasse algo para ler no meio do caminho, esquecia o mundo.  Não raro, minha mãe estranhava o silêncio e me encontrava sentada em meio ao lixo, lendo um pedaço de jornal, ou sentada na cama desarrumada, com um livro no colo.
                     Invariavelmente minha mãe se aborrecia, dizendo não ser hora para aquilo e a arenga seguia ao longo do dia.
         Destes tempos, guardo a lembrança de ler o meu primeiro almanaque. Era o Almanaque do Jeca Tatu, personagem imortal de Monteiro Lobato, meu autor mais querido de todos os tempos. “Jeca Tatu era um pobre caboclo que morava no mato, numa casinha de sapé. Vivia na maior pobreza, em companhia da mulher, muito magra e feia, e de vários filhinhos, pálidos e tristes” e eu conhecia tantos Jecas! Além de achar, à época, que o BIOTÔNICO FONTOURA  curava qualquer mal, aprendi, de cor, cada palavra daquele livreto, de tanto que o lia. Já adulta li Urupês e chorei, de saudades.
         Tempos depois  minha avó  me mostrou a Folhinha do Coração de Jesus, uma espécie de mini almanaque, um bloquinho com calendário, com conteúdo muito variado: receitas, piadas, mensagens, noções de higiene, santos do dia, curiosidades....que eu devorava a cada folhinha que  ela destacava, à medida que passavam os dias.
          Os almanaques eram minhas revistas de variedades e, através deles, o mundo chegava até aquele lugar sem energia elétrica, sem estação de rádio ou correio, nos confins do nordeste. No meu mundo de menina da roça foram fundamentais, pois através deles entrei em contato com um mundo que não fazia ideia que existisse e aprendi muito também com todas aquelas informações que lá estavam. Outras publicações do inicio do séc. XX, anuários, lunários, além dos almanaques, eram leituras obrigatórias das famílias, como fonte de atualização e entretenimento.
         Gosto muito deles até hoje.Sempre que necessário, meu material de trabalho para a formação de professores inclui os Almanaques Aluá 1 e 2, dos quais sou fã incondicional, publicados pela ONG SAPÉ (RJ)  e vários números da revista Almanaque Brasil de Cultura Popular, que também acesso virtualmente no end. http://www.almanaquebrasil.com.br/
      Nos meus momentos de muito cansaço sempre recorro a leituras leves, que me dão prazer e alegria, além de saciar minha fome e vício de ler. São minhas “leituras de almanaque”, momentos que o coração e a alma agradecem.


Da Série Leituras inesquecíveis