Visão

A visão é o mais importante dos nossos sentidos, sem nenhuma dúvida. Os olhos são os grandes portais por onde penetram para as entranhas do nosso cérebro as mais variadas informações, imagens alegres, tristes, coloridas ou não, quaisquer que sejam e são guardadas para acesso rápido ou então nas profundezas onde nosso consciente não pode alcançar.

Pequenos pacotinhos são separados, acumulados e com a idade e a cultura de cada um são remanejados, alterando suas prioridades, encaminhados alguns para um arquivo morto ou, quem sabe? Alguns serão mesmo irremediavelmente apagados da nossa memória.

Não é à-toa que mais da metade do nosso cérebro tem alguma relação com a visão e por isso não se pode falar do fenômeno visão dissociada da função cerebral, ponto central de todo processamento dessas informações, boas ou más, não temos o poder de escolher.

Assim, podemos ver agora ou muito depois aquelas cenas que nos emocionaram, que marcaram de alguma forma nosso dia-a-dia. Quem há de não projetar das profundezas do seu cérebro aquele pôr-do-sol deslumbrante, a lua cheia, seu luar prateado e cheio de mistérios; seus medos e receios; a briga teimosa do mar com os rochedos; a espuminha safada e irresponsável rodopiando; a primeira troca de olhares com a pessoa amada ou visão do filho que acabou de nascer? São tantas e tantas...

E as montanhas verdejantes ou cobertas da neve que o vento implicante teima em soprar; ver as árvores floridas, os rios caudalosos e barulhentos ou o tímido regato se escondendo debaixo da pedrinha lisa ou pulando gaiato por cima de um pequeno galho caído no leito? As cachoeiras nervosas e cheias de faniquitos escorregando livre ou virando cambalhotas até o sopé da pedreira lá embaixo; quem pode esquecer a imagem da Terra, nossa mãe comum, vista de um satélite, livre e flutuando como uma grande, colorida e frágil bolha de sabão envolta numa auréola tênue que vai se espraiando, espraiando até sumir no negrume do espaço?

Ah! Mas eu só queria ter meus olhos para ver o sol, as estrelas, as flores, os pássaros, os filhotes ou a borboleta amarela e sem graça, vagando desmiolada, sem rumo e sem o saber de estar ali. Eu queria ver o hoje e o amanhã encharcados de tanta felicidade. Eu quero ver e sentir a paz!

Não quero ver a guerra, não quero ver as mortes, doenças ou sofrimentos que poderiam ser evitados; não quero ver analfabetos, não quero ver miseráveis; não quero ver o poder econômico, político ou religioso massacrar ideias, tentar o bloqueio dos cérebros; não quero ver injustiças. Não quero nunca ver uma criança desnutrida chorando porque tem fome. Eu não quero ver qualquer criança chorando por qualquer motivo! Nunca! Eu não quero ver lágrimas nos olhos do pai ou da mãe impotente diante de um filho drogado. Eu não quero ver os fazedores de deserto destruindo as matas, queimando tudo, poluindo o ar, terra e água em nome de um progresso idiota, egoísta e burro. Eu não quero ver ninguém maltratando nossa Terra e tudo que nela há!

Eu não quero ver lágrimas nos olhos de gente como a gente, seja de que cor, raça, condição social, religião, esteja onde estiver. Eu não quero ver fronteiras; quero ir e voltar ao meu bem-querer. Eu só quero ver o brilho nos olhinhos travessos das crianças ou nos daqueles melancólicos, cansados e ignorados idosos. Eu quero ver todos os olhos cheios de vida, de alegria, com as mesmas oportunidades e acompanhados de um sorriso franco, despreocupado e confiante de um ser humano solto e feliz. Eu só quero e preciso de olhos para ver o amor, a fraternidade e a liberdade. Ah! Deus! Eu tanto quero ver famílias! Eu quero tanto ver todos com famílias, amigos, famílias, verdadeiros amigos...

Doce delírio! E delírio denota coisas deturpadas, falsas ou utópicas. Que pena!

Então me emociono, fecho meus olhos e choro.

Dbadini
Enviado por Dbadini em 01/04/2009
Código do texto: T1517640