amizade ou negócio?

Amizade Ou Negócio?

De tempo em tempo, faço uma visita a Dra. Lígia, minha oculista há algum tempo. Ela é uma especialista competente, exercendo a profissão há vários anos.

A consulta foi agendada através do plano de saúde que possuo. Acredito que devemos conhecer melhor o profissional que irá nos atender. Quando você o conhece, a consulta por convênio não difere de uma consulta particular, mas se você não o conhece é provável que sua consulta não irá durar mais do que sete minutos. E isso ocorre praticamente com qualquer tipo de especialidade. Por esse motivo, prefiro buscar sempre, além de um bom profissional, um amigo de preferência, para que possa ser atendido melhor, pois a amizade pessoal, nestas horas, pesa na balança.

Durante a consulta com a Dra. Lígia, quando já concluída a primeira parte do exame clínico, ela solicitou que eu fizesse um mapeamento da retina, com sua aluna da faculdade. Elas trabalham juntas no mesmo hospital. Marquei este exame para uns três dias após essa primeira consulta.

Primeiramente estava marcado para as dezesseis horas e quarenta e cinco minutos do dia três de junho. Argumentei pelo telefone com a pessoa que me atendeu se haveria possibilidade de ser mais cedo, pois tenho a acuidade visual diminuída pelo alto grau de miopia, além do astigmatismo e estrabismo. Neste horário eu teria certa dificuldade em voltar para casa, em função do colírio que é colocado nos olhos, para dilatação das pupilas. Com a consulta no final da tarde eu teria muita dificuldade para embarcar nos coletivos que me levariam de volta para casa, pois o exame seria feito num bairro muito movimentado de Belo Horizonte. Quando eu saísse do consultório, já estaria num horário de grande pique, de muito movimento, principalmente de carros na região. È o horário em que todos regressam para o aconchego do lar, para junto dos seus familiares.

Então, tive a idéia de chegar ao consultório mais cedo e com cara de pobre coitado pedir, se possível, para antecipar o exame. Fui até o local da marcação do exame. Eu mesmo senti que aconteceu uma transformação em mim quando entrei no laboratório, dando a impressão de um coitado, não pelos meus trajes e sim pela minha expressão facial, que era o de uma pessoa que parecia estar prestes a sofrer algum tipo de problema.

Dirigi-me a recepcionista do lugar, passando a ela o pedido da médica e perguntando se ela poderia fazer alguma coisa para me beneficiar em termos de horário, pois já era cliente antigo da clínica e tinha problemas de visão. Ela como trabalhava ali sabia que problemas assim dificultam o retorno à noite sozinho para casa. Então, ela respondeu-me que faria o possível para me ajudar e pediu para sentar e aguardar um pouco.

Logo fui atendido. A médica amiga da Dra. Lígia, já era minha conhecida e também era muito boa pessoa. Conversamos e me acomodei na cadeira para o exame. Ela administrou gotinhas de colírio que ao caírem nos meus olhos começaram a embaralhar a minha visão, coisa normal nesse tipo de exame. O objetivo desse colírio é facilitar o estudo mais profundo do mapeamento da retina. Depois de seis vezes pingado o colírio nos meus olhos, eu já tinha dificuldade até para ler uma revista.

O tempo de espera deve ter sido de uma hora, mas mesmo assim já estava muito tempo à frente, se fosse considerar o horário agendado anteriormente por eles. Após essa espera uma das mocinhas que trabalha no local me levou para a sala da médica que iria me examinar.

A Dra. Júnia logo me reconheceu, por já ser seu paciente. Eu, porém com a visão meio atrapalhada, não conseguia identificá-la direito. Não conseguia distinguir o que ela tinha no rosto e no cabelo, mas fiquei sem jeito de perguntar. Ela é uma pessoa jovem, muito boa de papo. Quando a Dra. Lígia se aposentar, gostaria de continuar fazendo minhas consultas com ela, por ser uma oftalmologista nova, e está sempre atualizada com tudo de novo que há no mercado. Seria mais cômodo também, quando precisasse fazer outro tipo de exame, pois resolveria tudo com ela mesma, sem precisar me deslocar para outro lugar.

No mesmo dia recebi o resultado do exame. Deixei para o outro dia ir ao consultório da Dra. Lígia. A consulta já estava marcada para o primeiro horário da manhã. No retorno ela me daria a receita para a confecção dos óculos novos, que faria uma diferença muito grande na minha visão, agora que estou permanecendo mais tempo usando o computador.

Fui então à Ótica Mineira, onde estou acostumado a fazer os óculos desde criança. Pedi o orçamento só das lentes, pois a armação dos meus óculos era nova. D.Ana após consultar a tabela de preços do material revelou-me que deveria ficar em torno de uns quatrocentos e sessenta e dois reais. Fiquei calado. Resolvi pensar, por acreditar numa ótica que durante várias décadas atendeu não só a mim, como todos lá de casa com a maior presteza.

Neste dia fui almoçar com o meu pai, ele sugeriu que eu fizesse um orçamento em outra ótica, pois ele estava achando caro e foi o que eu fiz. Desci a rua da minha casa e virando a esquina encontrei uma ótica, que é filial de uma rede. Passei a receita para o gerente. Quando ele me trouxe o preço, quase cai de costas. O orçamento era de duzentos e noventa reais em duas vezes. Tomei um choque com a disparidade de preço, pois não esperava isto da Ótica anterior.

Então, comecei a fazer uma pesquisa de preços a respeito dos óculos. Eu nunca vi variar tanto o preço assim. Até numa loja da mesma rede os preços eram diferentes para o mesmo artigo.

Ai eu fiquei a pensar se era comércio ou picaretagem tudo aquilo. Fiquei sem resposta para minha pergunta. À tarde troquei de roupa e coloquei uma roupa mais simples e vou contar para vocês que os preços caíram mais ainda. Percorri várias outras óticas, algumas das grandes redes, outras não. Cansado de procurar e já tendo um bom apanhado de preços, decidi pela compra. Primeiro, escolhi uma loja que fosse das grandes redes, de um modo geral o preço é mais baixo, isto é quase um fato consumado.

As pequenas lojas não têm como concorrer com lojas de grandes portes, as redes que investem em quase tudo, diversificando sempre e têm capital próprio para isso, enquanto as pequenas não têm como fazer, pois o dinheiro está difícil no mercado.

Conhecendo este princípio que citei aqui, entrei numa ótica. Logo apareceu um rapaz novo, do tipo que tem pouco tempo de estrada, que ainda tem muito para aprender, mas só o tempo será o seu professor, todavia era muito educado. Para ele cada caso que passar será uma lição nova que terá vivenciado e aprenderá uma coisa diferente. E foi ele que veio me atender com toda educação possível. Sou uma pessoa que brinca com todo mundo, pois acho melhor ser assim para descontrair o ambiente, para o papo correr mais solto.

Comecei falando o que queria em termos de lentes para a armação dos meus óculos. Quando acabei de falar, vi em seu rosto uma cara de quem ouviu, mas que não poderia me atender. Nisso chamou um dos gerentes da loja, o que me chamou a atenção pela cor da sua camisa rosa. Como eu não perco a oportunidade, por ser mais velho e saber que é um costume no comércio tratarem o cliente de senhor, então, eu sempre retruco e falo que senhor está lá em cima no céu. O vendedor explica o caso das lentes para o gerente. Ao escutá-los compreendo o porquê do espanto do balconista. Eles não tinham a lente que eu queria. Eles só trabalhavam com outra marca. Eu já tinha ouvido falar dela, mas na hora achei melhor telefonar para a oculista e pedir a opinião dela. E foi o que eu fiz. Ela me deu sinal verde para comprar as lentes e me sugeriu que colocasse nelas um dispositivo chamado anti-reflexo que me ajudaria bastante.

Enquanto a lourinha, que era outra vendedora da loja, morria de rir das palhaçadas que eu fazia com o vendedor e o gerente da loja, fomos discutir o preço dos óculos. A lente sem a melhoria que a oculista sugeriu ficaria em duzentos e noventa reais, em três vezes no cartão de crédito, achei ótima essa forma de pagamento.

O gerente me pediu uma semana para os óculos chegarem, pois teria de enviá-los a São Paulo, para ser feito o ante-reflexo nas lentes. E com isso fiquei usando o meu enéas, companheiro de longas jornadas, mas que estava defasado pelo menos por uns seis anos. Mas era ele que me acompanhava nestas horas, pois não posso ficar sem usar óculos, eles já fazem parte de minha indumentária.

No nono dia telefonei para a Ótica querendo saber notícias dos meus óculos. O gerente avisa que deverá chegar quarta–feira à tarde. Fiquei feliz com a idéia. Esperava como louco a danada da quarta-feira, pois não sou ninguém sem os óculos.

Na quarta-feira me dirigi à ótica. Chegando lá o gerente mexe na gaveta dos pedidos que tinham vindo de São Paulo, mas os meus óculos não estavam ali, já imaginaram como fiquei? Nisso entra na loja um senhor que me pareceu ser importante lá, mas fiquei calado. Depois, falei com ele da minha dificuldade de visão e da necessidade destes óculos, pois o gerente tinha me falado que provavelmente chegaria pelo malote de sexta-feira à tarde.

Desiludido, volto para casa. Teria de esperar até sexta-feira, para poder pegar definitivamente meus óculos novos. O pobre do enéas tentava fazer seu papel, mas já estava velho demais, não evoluiu com o tempo.

Fiquei perdido nesse tempo todo. Nessa mesma quarta-feira, no crepúsculo, ligaram-me da ótica falando que os meus óculos estavam prontos e que eu poderia ir buscá-los na quinta-feira. Isto me deixou mais preocupado ainda e sem resposta. Ninguém conseguia me explicar se os óculos ficariam prontos na quinta-feira em São Paulo e chegaria pelo malote de sexta-feira à tarde, ou se depois seria feito o trabalho de montagem dele e como ele poderia já está pronto aqui na quarta-feira?

Peguei os óculos na ótica, apesar de todas as dúvidas, ele me agradou em cheio, mas “a vida tem mistérios que até a própria razão desconhece”.

Aprenderam um pouco com esta história?

Escritordsonhos
Enviado por Escritordsonhos em 06/04/2009
Código do texto: T1526097