O Tempo Que Me Resta

O Tempo Que Me Resta

No tempo que me resta, vivo na gangorra de duas questões: viverei para sempre, ou hoje é o último dia? Nem sempre quero uma resposta rápida. Já percebi que quase todas as questões são pertinentes, mas a relva só clareia quando me conecto com Ele. Tenho de viver conectado, no tempo que me resta.

Vou pra lá, vou pra cá. Com certo exagero, exclamo: vivo afobado. Com certo tempero, concluo: estou amalgamado. Como se fosse o último dia. Daí, fumo um cigarro, como se fosse viver para sempre. Assim, contemplo a lua cheia e a copa das árvores com dupla intenção. Deposito cada resíduo desse olhar num local especifico, divagando sobre a possibilidade de observá-los depois. Eles escorrem. Então, conforta-me o fato de tê-los visto.

No tempo que me resta, ganhar ou perder são duas moedas falsas, com dois lados falsos. Se viver para sempre, tentarei explicar isso melhor, embora para mim já esteja claro. Se tentar, será por altruísmo. Mas não deixo de morder as moedas, para checar se são verdadeiras. Tolo hábito.

Palmilhando o percurso, ora julgo estar certo, ora estar errado, pior mesmo é quando coloco terceiros no meu tribunal particular. Embora aconteça silenciosamente, acontece com freqüência. Cansativo hábito. Filas e filas de seres vão pingando na minha corte. São catalogados à revelia. Não posso dizer julgados, pois isso implicaria em sentenças. Depois de classificá-los, absolvo-os todos. Fico contente quando não aparece ninguém. Hei de tramar melhores meios de utilizar o tempo que me resta, mesmo que eu viva para sempre.

Sei de muitas histórias, ainda que retenha bom senso suficiente para saber que existe espaço para muitas outras.

Todos os dias, ciente de que esta expressão parece um contra senso, e sobrepujado pelos parâmetros governantes deste ensaio, ao me conectar com Ele, minha atenção sobre coisas e pessoas ganha determinado fluído, que torna tudo a um só tempo próximo e distante, grande e pequeno, pontiagudo e macio. Nessa ordem.

A paciência Dele é digna de nota. Lacônico, expressa que devo focalizar meus estudos sobre minhas próprias ações. Mas não com muita severidade. Alerta que não há motivo para angustiar-me, mesmo que hoje seja o dia derradeiro, ou apenas mais um numa conta sem fim. Algumas palavras que Ele usa são truques de comunicação para que eu perceba, nalgum momento, que aquilo que Ele está transmitindo não é A, nem B, e sim C. Diz compreender perfeitamente que minha mente requeira intervalos explícitos, como A e B, para atingir o devido entendimento.

Finda a conexão, vou passear. Ao ver a lua cheia, lembro de outras. Quanta coisa não fervilha. Passeio lá e cá. Calmo. Banhado. Se for o último dia, me arrependerei de alguma coisa, inda que isso ocorra dia sim, dia não. Se for viver para sempre, corro o risco de aprender alguma coisa.

Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 09/04/2009
Reeditado em 16/05/2013
Código do texto: T1530707
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