Era uma vez um velho contador de histórias.

Era uma vez um velho contador de histórias.

Ele já havia passado a semente de sua família, e agora regozijava-se de seu neto de dez anos (“duas mãos inteiras, sem os dedos dos pés!”).

E, nessa história sobre histórias, onde nenhum personagem tem face ou nome, o tempo já se passara para o bom e velho senhor.

Suas mãos já tremiam demais para que ele pudesse escrever; seus olhos estavam cansados demais para ler; mas sua voz, sua voz ainda não titubeava quando era para contar histórias.

Lembrava de como sua filha, mãe de seu neto, adorava ouvir as mirabolantes e épicas histórias que sua imaginação, na época não tão polida pela estrada esburacada do tempo, criava.

Seu neto não precisava dele para contar histórias; seu neto tinha televisão, vídeo-game, computador.

E cada vez mais o velho contador de histórias via-se obsoleto.

Uma noite (sem que eles todos soubessem, mas exatamente uma noite antes do vívido senhor chegar ao fim de sua história nessa história), um pouco antes da hora de dormir, ele ouviu uma batida na porta de seu quarto.

Levantou-se e abriu a porta, deparando-se com a pequena figura de seu neto.

Coçando o olho esquerdo, o pequeno e sonolento descendente sussurrou: “Vo-ô, conta uma história pra eu dormir?”

Os pulmões do idoso inflaram-se como há anos não faziam. O sorriso que abriu-se em sua face quase fez suas rugas desaparecerem.

E nos quarenta e seis minutos que seguiram ao pedido, um mundo mágico e novo foi criado à luz do abajur de dormir do pequeno garoto. O idoso gesticulava e mudava sua voz, abusando das cordas vocais, elaborando na mente do neto todo e qualquer detalhe que sua imaginação fazia nascer.

E quando a criança já dormia, velejando nos rios da própria imaginação, que tratava de complementar a história do avô, o idoso lembrou-se de porque gostava tanto de contar histórias.

Porque a televisão, o vídeo-game e o computador podem entreter, mas somente a voz, o amor e a imaginação presentes têm o poder de guiar os ouvintes através dos sonhos.

E naquela noite ele contou sua última e melhor história. E sua própria imaginação deu continuidade à sua história em seu sonho; um sonho do qual ele jamais saiu – e assim foi feliz.