NÁUFRAGOS

“Tudo que se passa aqui não passa de um naufrágio”

Disse assim D’Javan que, em uma de suas andanças pelo cosmo, percebendo-se nada tornou-se a nós tão imenso quanto verdadeiramente é. E notando esta afluência desprendida de maneira tão bela, percebi o quanto às vezes somos tão ridículos quando buscamos definir uma idéia para tudo, apenas um conceito para a plenitude de tudo o que há.

Este foi o prêmio buscado pela grande olimpíada, ou apenas uma imagem criada por religiosos fanáticos para a expiação de pecados? De qualquer modo, tudo não nos levou à sua conquista, porque não há o que conquistar a não ser o reconhecimento disto.

Notamos que, na verdade, a busca é o verdadeiro encontro. Imagino como seria tedioso dar-se por encontrada a perfeição, se esta nos reserva a privação das oscilações, dos erros, dos lapsos tão necessários para o crescimento. Seria tão chato serem todos perfeitos jogadores de xadrez, ou todos perfeitos artistas plásticos. Qual seria a nossa preferência, se nós mesmos seríamos auto-suficientes? Seríamos tão tristes. E quão triste seria Deus se todos acreditassem em Sua existência ou se todos o adorassem de uma só maneira, numa única fé.

A busca pelo sumo ser causou a suma dúvida, a obscura questão de quem ou o que realmente somos. Esse desastroso baile não contou com a presença de convidados e todos se tornaram os bobos da corte, cada um com a sua alegoria, cada um com a sua tola intenção de conquistar o quê? Riquezas, poder, fama? A forma como Constantino, entre tanto outros entrou na cena é de tal modo hilário. Atando fardos pesados, devorando a lã das pobres o[velhinhas], sugando até o osso o sangue derramado – crê-se – por Jesus Cristo pela humanidade.

Antes disso houve até uma gama de corações bonzinhos, desejosos por salvar a humanidade, ou ao menos a si próprios, com umas máximas felizes, umas parábolas tocantes e umas formas de culto até estranhas, diga-se de passagem. Mas como eram felizes esses seres, caminhando pelo lado oscilante da vida, experimentando o sabor do não saber, do não querer compreender o incompreensível, não ter a extrema pretensão de tocar o pó de ouro que caem das sandálias de Deus.

A pergunta que nos vêm à mente é apenas uma: por quê? Por que precisávamos passar por tantas ebulições e por que ainda passamos por elas? Qual o conceito que seria aproveitável nessa questão? A reencarnação de Kardec, a predestinação, a teoria da relatividade, o plano de salvação dos cristãos e etc.?

Sinceramente, não nos cabe estar sujeitos a nenhuma destas questões. Este seria o pensamento daquele que deseja tanto a reaproximação com o ser. Ativar em si próprio o espírito livre, como diria Nietszche, e travar suas próprias batalhas, tanto no mundo interno quanto no que a envolve e torna as suas escolhas possíveis, corretas. Ou seja, um conceito de moral individual. É claro que há a coisa da cultura, do meio, da educação que recebemos desde o nascimento. Mas esse não seria um problema, já que este espírito livre seria tomado posse depois de formada uma estrutura, uma base de idéias que tornasse possível esta atitude, porque se assim não fosse não seria livre.

Mas enfim, estarmos sóbrios já nos é proveitoso. Observando as embarcações que vão chegando e julgando se estas seriam as confiáveis. E, se acabarmos por entrar pelo cano, que ao sairmos possamos entender o porquê precisarmos ter o espírito tão livre.

Júlio Miguel
Enviado por Júlio Miguel em 19/04/2009
Código do texto: T1548166
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