Busca pela vida começa no canteiro

Ele está ali praticamente todos os dias. Corpo franzino, pele clara, cabelos lisos, vestindo calção e camiseta. Os pés vivem descalços. O canteiro é o seu território depois das 18 horas, quando o “dono do ponto” vai pra casa, ficando a oportunidade de ganhar uns trocados “olhando os carros”, principalmente de clientes de uma clínica médica e de alunos de um curso profissionalizante.

Sob a cobertura de uma cigarreira fechada, no cruzamento da rua Antônio Basílio com a Romualdo Galvão, esse rapazinho de uns 12, 13 anos, aparentemente, ganha a vida. Dia desses, parei o carro à luz vermelha do semáforo. Ele estava sentado no meio-fio, todo encolhido, aquecendo as mãos entre os joelhos. A chuva tinha parado há pouco tempo. Cruzamos os olhares rapidamente, veio a luz verde e quando dei partida, ouvi a mensagem vindo daquele menino: “Vá com Deus, moço!”. Deu tempo apenas para agradecer-lhe com um rápido aceno, porque o motorista que vinha atrás mais parecia que estava prestando socorro a alguém e queria passar por cima de todo mundo. Eram cerca de 21h30.

Terça-feira passada, a cena se repetiu, mas dessa vez ele se aproximou: “Moço, me dê aí uma moedinha pra comprar uma comida”. Entreguei algumas moedas e ele puxou conversa: “Moço, eu trabalho aqui pastorando carro, quando o dono do ponto vai embora. Sei que muita gente tem até medo de mim, mas quero vencer na vida”. As palavras transmitiam sinceridade. O olhar daquele pequeno brasileiro brilhava, num contraste com a noite. “Trabalhe com honestidade que você consegue”, disse-lhe. “Que horas você vai pra casa?”, eu quis saber. “Tenho casa não, moço. Eu moro na rua, em qualquer lugar”. Novamente, a luz verdade aparece, como um ponto de esperança para nós dois. Sigo meu destino. Meu amigo ficou pra trás, querendo ser honesto, para vencer na vida. Que Deus o abençoe.

(Publicado no JH Primeira Edição - Coluna João Ricardo Correia - 24.04.09)

João Ricardo Correia
Enviado por João Ricardo Correia em 25/04/2009
Código do texto: T1559421
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