Agora conta como hei de partir.

Agora conta como hei de partir. Estou sozinho de novo, sentado na calçada em frente a um bar. Porque escolhi esse destino. Queria estar com meus filhos que nunca tive; com minha mulher que não tenho; com minha mãe que me recusou a ter. Sempre fui sozinho, mas como? Se pessoas sempre passam por mim, como sou sozinho no meio dessa multidão.

Escolhi isso para mim antes de vim para cá? Não, não posso ter escolhido. Queria alegria de uma rosa na minha mão e da minha filha; minha mão segurando a bola que meu filho chutou; meu lábios na boca da mulher que me amou. Mas tenho que me satisfazer com uma simples moeda no meu velho boné.

Tenho que levantar todos os dias e não sair do lugar. Não tenho casa, ou tenho? Poderia chamar a rua de casa, mas queria ter a casa que nunca tive. Um quarto com uma cama, uma cozinha, um banheiro, um... Queria tudo mas não tenho nada. Apenas o meu corpo surrado a sustentar minha alma. Porque não me dão oi, não me dão abraços, beijos e um aperto de mão. Sozinho desde sempre.

Aquela criança ali, qual o nome dela? qual a história dela? Não sei, mas porque deveria saber, se eu não sei nem a minha história, nem meu nome. Meus pés estão doendo de andar no asfalto quente, mas não me deixam mais sentar na calçada em frente ao bar, sou um intruso na sociedade. Me evitam, me chutam, riem de mim, sem eu ter feito nada, apenas por ser eu. Nem sou eu quem conto isso, é quem me criou.

Quem será que teria o prazer de me ver sofrer assim. Muito obrigado meu criador, mas preferia ter ficado onde não era para ter saído.

Desculpa ter te inventado meu querido amigo sem nome, mas teu simples relato leva a reflexões complexas. Muito obrigado senhor do corpo surrado e seu velho boné, quando passar botarei mais moedas nele.

Carlos Chaves
Enviado por Carlos Chaves em 17/05/2009
Reeditado em 17/05/2009
Código do texto: T1599830
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