PROMÍSCUA INDIFERENÇA

Na tarde do dia 21 de dezembro de 2008, final de primavera e início de verão, deparei-me com um cenário até então inusitado, para quem viveu 27 longos anos na cidade de São Paulo. Metrópole tida, como uma das mais violentas do mundo, entretanto jamais me concedeu aos olhos, um cenário tão repugnante como aquele que tive a infelicidade de ver, no permeio das duas estações do ano. Aquela tarde de domingo, maculou a consciência humanitária desta sociedade, até então cristalizada na égide fraterna. Mas, a minha Bom Sucesso...! Regaço de amor, cordialidade e generosidade da minha infância; já não existe mais.

Na inércia fria e indiferente da rua, Capitão Maromba, eu caminhava como fazia todas as tardes de domingo, rumo à casa de minha mãe. Um Garoto entre 14 e 16 anos de idade, havia sido assassinado a facadas na noite anterior, por um outro jovem de igual idade. Duas crianças que se jogaram no jogo macabro de sentimentos primitivos, fotografados pela retina da morte. É nesses espetáculos mórbidos, dentre os quais esta civilização consumista da insensatez globalizada, se faz apática. Atinada pelos propósitos profanos da vida, desconhecendo por completo, aqueles que descortinam na alma humana o cuidado, a piedade e a compaixão. O pior crime! É aquele que não nos toca a alma, faz com que a brutalidade cometida, seja cenário de exibição perfeita, para o júbilo da indiferença social, diante de um fato tão abominável. A marca do crime; sórdida e impiedosa, servia de troféu e mostruário gratuito, aos transeuntes que passavam. Desenhando, na alma desse povo, a graça pela desgraça. Motivo pelo qual escrevo essa crônica.

A passividade de moradores próximos, que não tiveram a sensatez e comoção humana de desfazer o palco de sangue derramado em praça pública. Exibição “Dracular”! De uma fome psíquica e implícita, que fomenta a destruição do homem, ou melhor: De uma criança que esta sociedade acéfala de bons exemplos e fraternidade, tenta decompor sob o enfoque de lixo social, originário de nossa própria alma. Em nossas atitudes (Sociais, políticas, culturais e religiosas). Dentro desse aspecto sócio-humanitário, deveríamos exaurir do chão a representação simbólica da desgraça! E da alma, o troféu que por ali alimentou dias, até que o céu apiedou-se e lavou com suas lágrimas, a honra e a compaixão daquele que partira de maneira brusca e precipitada, justificando toda a estupidez humana. No local, todos que passavam, eram obrigados a deliciarem-se da situação de mapear o sangue derramado, que mais parecia, ao sacrifício de um animal. Não...! Ali, caracterizava o extermínio de uma criança, que não nos caberá julgar a moralidade ou a vulgaridade dos motivos, o que nos alude, é o sentimento de compaixão e consciência, de que somos resíduos universais de uma mesma essência. Já que não fomos capazes evitar as circunstâncias e desfecho trágico; humanamente seria de bom grado, lavar do asfalto o troféu. Expurgando de nossa consciência (o faz de conta que não vi). Estaríamos com certeza iluminando a memória de quem esteve entre nós, por um curto espaço de tempo. Entretanto, não passou despercebido pela vida e terá seu memorial erguido nos jardins da existência, ou na nebulosa errante, de quem buscou na vida seu espaço entre os humanos: sua inclusão, seu desejo de vencer a adolescência e chegar à juventude. Ambas ficaram perdidas pelo caminho, porque nós seres “civilizados” ainda não sabemos lidar com as questões singulares, que contemplam a solidariedade.

Por outro lado, Alguns devem estar imaginando ou mesmo questionando, a dramaticidade do texto. Se por acaso isso, está a acontecer com você leitor! Talvez seja... Pelo fato de não ter presenciado tamanha atitude desalmada, e uma desalmada indolência de espírito.

O que queremos chamar atenção: É de que precisamos ser “unos,” para que essa unicidade seja a razão maior de nossa sobrevivência como sociedade. E a nossa cumplicidade com o todo, afim de que possamos ter, mais alguns segundos de vida sobre a terra.

Elaborado por:

Paldinis Moraes do Nascimento (DINIS)

Dinis
Enviado por Dinis em 18/05/2009
Código do texto: T1600427