O engenho e a tapera

Tudo começou ali relata Dona Tilosa, naquela época eu não sabia que os mutirões nas fazendas eram programados pelos nossos pais com fins matrimoniais. Era meu primeiro mutirão eu tinha apenas treze anos. O mutirão era na fazenda de nosso vizinho Coronel Murta, eu era a filha do coronel Badaró.

Chegamos muito cedo e a fazenda já estava toda agitada. Sendo filha de coronel eu tinha direito de ficar na cozinha junto com as filhas de Coronel Murta, mas inexplicavelmente alguma coisa me arrastou para a casa de farinha. Lá estava dez carros de mandioca para serem descascados e preparados para fazer a farinha. Percebi que não terminaria em menos de três dias, só de olhar aquela montanha de mandioca me senti cansada.

Ali em frente a casa de farinha ficava o engenho, daqui a gente não conseguia ver nitidamente quem era aquele “rapaz” que conduzia os bois que movimentava o engenho para fazer a garapa e produzir rapaduras! Mas a sua voz me chamou atenção, ele tinha um palavreado diferente dos carreiros cotidianos. O incrível é que só fui ver aquele rapaz a noite, e do jeito que ele me olhou me devorando com os olhos, mesmo sem querer eu correspondi. Diante daquela “cena” não era preciso de palavras! Estava tudo consumado e no próximo “mutirão” ele me pediria em casamento. O inexplicável é que meus pais já sabiam disso. Só mais tarde, anos depois que fiquei sabendo que “eles” tinham seus olheiros.

E Leocaldio cumpriu sua promessa que os seus olhos me fizeram. E em pouco tempo separamos uma fazenda e construímos uma família. E ali do outro lado daquele riacho morava Donana, filha de Coronel Murta que também arranjou um casamento naquele mesmo mutirão em que conheci Leocaldio.

Os filhos de Donana não estudaram, não foram para Belo Horizonte ou São Paulo e todos construíram suas vidas ali! Mas comigo foi diferente fiz meus filhos virar gente, todos estudaram, bateram “azas” e foram para a capital. Leocaldio morreu, fiquei sozinha tive que mudar pra cidade e morar sozinha. Pra minha sorte encontrei Babita neta de uma antiga escrava minha, ela se chamava Sinhana.

Agora ela me conduz nesta cadeira de rodas e de vez enquanto pegamos um taxe e venho visitar a velha tapera e me recordar de meus filhos quando ainda eram pequenos.

moraesvirada
Enviado por moraesvirada em 03/06/2009
Código do texto: T1629754
Classificação de conteúdo: seguro